Cracolândia: em ação da Defensoria, TJ-SP reafirma, após recurso, a proibição de remoções compulsórias de pessoas e interdições ou demolições de edifícios, até cadastramento para atendimento de saúde

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.

Publicado em 26 de Novembro de 2019 às 12:00 | Atualizado em 26 de Novembro de 2019 às 12:00

Em decisão publicada nesta segunda (25/11), o Tribunal de Justiça (TJ-SP) reafirmou, após recurso, uma sentença favorável obtida pela Defensoria Pública de SP que proíbe a remoção compulsória de pessoas, bem como bloqueio e demolição de edificações na área delimitada pelas Alamedas Nothmann e Cleveland, assim como as Avenidas Rio Branco e Duque de Caxias, na região conhecida como Cracolândia. A decisão de segunda instância reitera o conteúdo de liminar proferida em maio de 2017  e de sentença de junho de 2018.

As ordens judiciais impedem que qualquer remoção aconteça sem que seja feito prévio cadastramento das pessoas para atendimento de saúde e habitação, disponibilizando alternativas de moradia e atendimento médico, além de permitir que retirem pertences e animais de estimação dos imóveis. Elas atendem a uma ação ajuizada pela Defensoria, com o objetivo de impedir remoções compulsórias e as demolições, bem como garantir atendimento habitacional e assistencial prévios a qualquer remoção.

A nova decisão foi proferida por unanimidade pela 3ª Câmara de Direito Público do TJ-SP. Em seu voto, a Desembargadora Relatora Paola Lorena apontou que cabe ao Judiciário analisar a razoabilidade e proporcionalidade das consequências de interdição e demolição de prédios na região. “Fato é que não restou demonstrado nos autos a existência de devido processo administrativo, em transgressão a direito fundamental previsto no art. 5º inciso LV, da Constituição Federal”. A decisão enfatiza, ainda, que uma atuação do poder público “sem prévio estudo da situação e busca de uma possível solução” apenas mudaria o problema de endereço, sem solucioná-lo.

“A situação descrita vai de encontro ao disposto no Decreto nº 7.053/2009 que traz, em seu artigo 5º, princípios vinculados à Política Nacional para a População em Situação de Rua (...)”. Ao fim, o TJ-SP confirmou a necessidade de cadastramento prévio de todas as pessoas removidas para fins de atendimento em saúde e por políticas assistenciais e habitacionais.

Saiba mais

Na ação civil pública ajuizada em 2017, a Defensoria relatava que constatou no local, após entrevistas com pessoas atendidas, violações a direitos da população em situação de rua, comerciantes e residentes da Rua Helvetia e arredores.
 
A Defensoria argumentou à Justiça que a Prefeitura Regional da Sé iniciou procedimento de fiscalização das edificações e que os termos de interdição têm como consequência imediata a demolição de prédios, independentemente da presença de bens e de pessoas, e sem dar oportunidade de retirada de pertences e documentos. A Defensoria apontou ainda que três pessoas ficaram feridas após desmoronamento de uma parede, e que o poder público municipal removeu indistintamente bens de uso diário, como roupas e cobertores, confiscando e colocando documentos pessoais em caminhões de lixo.
 
A ação também apontou que demolições só deveriam ocorrer após atuação do serviço social das Secretarias Municipais de Assistência e Desenvolvimento Social e de Habitação, sendo que a população em situação de rua que ficava na região hoje está desprovida de referência territorial e sem acolhimento fixo em serviços sociais. A Defensoria Pública argumentou também que a remoção administrativa e as demolições, sem que haja o devido processo legal ou ordem judicial, violam a Constituição, a legislação e outras normas.  

A ação original foi assinada por sete Defensores e Defensoras então Coordenadores de Núcleos Especializados da Defensoria: Carlos Weis, Rafael Lessa e Davi Quintanilha (Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos); Luiza Lins e Rafael Faber (Núcleo de Habitação e Urbanismo); Fernanda Pinchiaro, (Núcleo de Direitos do Idoso e da Pessoa com Deficiência); e Yasmin Mercadante (Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher).

O caso foi acompanhado perante o TJ-SP pelo Núcleo Especializado de Segunda Instância Tribunais Superiores - a Defensora Coordenadora, Luciana Jordão Armiliato de Carvalho, realizou a sustentação oral no julgamento pela 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal, após realização de audiências de despacho e memoriais.