Economia do cuidado: a pedido da Defensoria, TJSP determina que tempo de amamentação seja usado para redução de cumprimento de pena
Lei de Execução Penal prevê remição por trabalho. Defensoria argumentou que a amamentação é equiparável à atividade laboral
Justiça decidiu pela remição pelo trabalho na economia do cuidado, pela aplicação analógica do artigo 126, parágrafo 1º, II da LEP, com a proporção de 1 dia remido para cada 3 dias de cuidado l Foto: Agência CNJ
A Defensoria Pública de SP obteve no Tribunal de Justiça do Estado (TJSP) decisão que reconhece o tempo de amamentação como fator passível de contagem para fins de remição de pena de privação da liberdade em relação a mulher que cuidou de seu filho dentro do estabelecimento prisional. O acórdão acolhe argumento da Defensoria e aplica o entendimento de que a amamentação se enquadra no conceito de “economia do cuidado” e, assim, pode ser equiparável a trabalho, podendo ser utilizado, nos termos do artigo 126 da Lei de Execução Penal (Lei 7.210/1984), que trata da remição de pena por tempo de trabalho ou estudo.
O juízo de primeiro grau indeferiu pedido de remição feito pelo defensor público Douglas Schauerhuber Nunes, que atua na unidade da Defensoria em Limeira, em favor de uma mulher que cumpria pena na ala de amamentação de uma unidade prisional, onde permaneceu com seu filho. Assim, a Defensoria Pública apresentou agravo, elaborado pela defensora Marcelli Penedo Delgado Gomes, à Corte estadual.
“A Lei de Execução Penal (LEP) consolida o trabalho como um dever do sentenciado (artigos 28 e 31), e isso não desclassifica, de maneira alguma, o exercício de atividades laborais distintas para a remição de penas, pelo contrário”, sustentou a defensora. “A permanência das genitoras com seus filhos durante o período de amamentação se caracteriza como um direito, tanto dos filhos, quanto das genitoras. Contudo, de fato, uma vez adquirido, este direito ensejará o dever de cuidado por parte da mãe, assim como qualquer outro trabalho exercido para fins de remição.”
Tese institucional
A argumentação se baseou em tese institucional elaborada pela defensora pública Mariana Borgheresi Duarte e pelos defensores Douglas Schauerhuber Nunes e Raphael Camarão Trevizan, a qual sugere que, “na execução penal provisória ou definitiva, seja pleiteada a remição pelo trabalho na economia do cuidado, pela aplicação analógica do artigo 126, parágrafo 1º, II da LEP, com a proporção de 1 dia remido para cada 3 dias de cuidado. Por economia do cuidado entende-se as atividades desempenhadas por pessoas que se dedicam à satisfação das necessidades físicas e psicológicas de terceiros, seja esse cuidado remunerado ou não.
No acórdão, a 12ª Câmara de Direito Criminal do TJSP, por unanimidade, deu provimento parcial ao recurso para que o estabelecimento prisional informe o tempo que a mulher esteve disponível para amamentação da criança e, posteriormente, o Juízo de primeira instância faça operar o desconto da remição na pena privativa de liberdade.
“A amamentação é sim um trabalho materno que qualifica e dignifica a mulher, a exemplo de todas as outras atividades que, para mulheres e homens, se possam incluir no vasto repertório do artigo 126 da Lei 7.210/1984”, observou o relator, desembargador Mazina Martins. “Se há então uma economia do cuidado é porque, na sua base, certamente subsiste um trabalho do cuidado. Afinal, não se forma economia alguma sem um trabalho de alguém que sustente essa economia. Ou, ainda, não existe economia sem o trabalho conjunto de muitas pessoas que façam e construam essa dada economia”, acrescentou o magistrado.