São José do Rio Preto

Após atuação da Defensoria Pública, pessoas internadas indevidamente em hospital psiquiátrico são encaminhadas para residências terapêuticas

Decisões estão de acordo com a política antimanicomial, cujo objetivo é o fim das internações psiquiátricas

Publicado em 22 de Setembro de 2023 às 14:21 | Atualizado em 22 de Setembro de 2023 às 14:21

Foto: Freepik

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A Defensoria Pública de SP na cidade de São José do Rio Preto tem obtido diversas decisões judiciais que determinam a desinternação de pacientes de hospital psiquiátrico da região. As decisões vão ao encontro da política antimanicomial que existe no país desde 2001.

Em um dos casos em que a Defensoria atuou, o paciente já contava com alta médica do hospital psiquiátrico Dr. Bezerra de Menezes desde fevereiro de 2017. Em que pese ele ser diagnosticado com esquizofrenia paranóide, de acordo com os pareceres médicos, o paciente realizou o tratamento terapêutico recomendado, e, decorrido o prazo previsto, não havia qualquer motivo para ele permanecer em tratamento em meio fechado.

Dessa forma, o defensor público Júlio Tanone ajuizou uma ação em que apontou que a recomendação médica de alta hospitalar torna ilegal a continuidade da internação do paciente – que, por falta de vaga em instituição adequada, continuou internado compulsoriamente por mais de 6 anos. Assim, pediu a disponibilização de vaga em residência terapêutica, com equipe 24 horas e atendimento multidisciplinar.

Na decisão, o juiz que analisou o pedido reconheceu a falta de justificativa para manter a internação do paciente. "Diante deste quadro, em consagração ao princípio da dignidade da pessoa humana, e visando à proteção do direito à saúde e à integridade física e mental assegurados pela Constituição Federal, é perfeitamente cabível o abrigamento do paciente citado em clínica de caráter residencial com equipe 24 horas e atendimento multidisciplinar em saúde mental".

Vulnerabilidade

O caso relatado não é único em que a situação de vulnerabilidade econômica do paciente o impediu de receber tratamento mais digno para sua questão de saúde mental.

Em outra atuação da Defensoria, o paciente de 67 anos, também diagnosticado com esquizofrenia, encontrava-se internado há 16 anos. A família, sem condições de acolhê-lo, havia feito pedido de vaga em instituição adequada, porém o pedido foi negado.  

Um outro paciente, de 58 anos, também já havia recebido alta médica e indicação de tratamento ambulatorial desde janeiro deste ano, porém, sem apoio familiar, continuava internado. Na ação, a Defensoria Pública aponta que, de acordo com a equipe multidisciplinar da instituição, o serviço residencial terapêutico é o mais adequado para seu acolhimento.

O defensor Júlio Tanone apontou que um dos objetivos da política antimanicomial existente no Brasil é o fim das internações psiquiátricas, e que a solução das residências terapêuticas representa um avanço no tratamento de saúde das pessoas em situação de vulnerabilidade. "Justamente nesta linha é que a Defensoria Pública objetiva o acolhimento de pacientes em residência terapêutica ou entidade que preste serviço similar e não em hospital". 

Luta antimanicomial

No final dos anos 80, surgiu no Brasil o movimento de luta antimanicomial. A ideia era combater o modelo de tratamento manicomial - no lugar do isolamento social de pessoas com transtorno mental, dar a elas tratamento digno, de forma a preservar o convívio social e a cidadania. Já em 1987, profissionais da saúde mental críticos a esse tratamento desumano e cruel lançaram um manifesto pela extinção dos manicômios.

Em 2001, a Lei 10.216, conhecida como "lei da reforma psiquiátrica" estabeleceu como direito da pessoa com transtorno mental "ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade".

Para garantir atendimento integral, não restrito ao transtorno mental, passaram a ser criados equipamentos de saúde mental em substituição aos manicômios, como Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), centros de convivência, residências terapêuticas e associações de usuários e familiares. A Defensoria Pública atua pelo fortalecimento dessa rede.