A pedido da Defensoria, STJ afasta falta disciplinar e garante a detento direito a continuar frequentando curso universitário
“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.
A Defensoria Pública de SP obteve no Superior Tribunal de Justiça (STJ) habeas corpus a um estudante que cumpria pena no regime semiaberto em São Carlos e foi flagrado com um telefone celular na mochila ao retornar ao estabelecimento prisional após um dia de aula. Ocorre que o rapaz usava o celular normal e legalmente durante o dia e, nesse dia, esqueceu de deixar o aparelho no armário da instituição de ensino onde estudava, como costumava fazer.
João (nome fictício) cumpre pena desde 2010. Quando estava no regime semiaberto, em 2015, foi autorizado a frequentar curso superior de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas, no Instituto Federal de Educação, campus de São Carlos. Em 2016, diante de sua aprovação no vestibular, foi autorizado a cursar Fisioterapia na Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). No entanto, em outubro de 2018, no seu retorno para o estabelecimento prisional, após um dia regular de estudos, foi encontrado um aparelho de telefone celular dentro de sua mochila.
Ausência de dolo
Na sindicância instaurada para apurar a falta, ficou provado que o paciente utilizava o celular durante o período de estudos, para facilitar sua comunicação com outros alunos e, quando retornava para a unidade prisional, deixava-o no armário da Universidade. No entanto, naquele dia havia esquecido o aparelho em sua mochila, sem qualquer intenção de utilizá-lo. João usava o telefone, doado por um colega de faculdade, para se comunicar com o restante da turma e para auxiliá-lo nos estudos e atividades universitárias.
Em Juízo de primeiro grau a falta não foi reconhecida, sob o fundamento de ausência de dolo específico do sentenciado ao ingressar com o aparelho de telefone na unidade prisional. Porém, após recurso interposto recurso pelo Ministério Público (MP-SP), o Tribunal de Justiça (TJ-SP) condenou João por falta disciplinar grave e determinou a regressão para o regime fechado. Antes de julgado o recurso, no entanto, João havia progredido para o regime aberto.
Habeas corpus
Após a decisão do TJ-SP, o Defensor Público Pedro Naves Magalhães interpôs Recurso Especial e, concomitante, impetrou habeas corpus no STJ. Além de demonstrar a ausência de dolo na conduta do jovem, o Defensor mencionou que ele pertence ao grupo de risco para Covid-19, uma vez que adquiriu tuberculose dentro do estabelecimento prisional. “Manter a decisão do Tribunal de origem seria desconsiderar o sucesso do recorrente em sua execução penal, caso absolutamente raro e distinto da maioria, jogando-o de volta ao regime fechado, sem qualquer análise individualizada de sua conduta”, sustentou o Defensor.
Em 16/9, quando João já estava com mandado de prisão expedido, em decisão liminar, o Ministro Felix Fischer, do STJ, acolheu os argumentos da Defensoria e reestabeleceu o regime aberto ao paciente. O Magistrado classificou como plausíveis as alegações do Defensor de que, caso a condenação fosse mantida, João teria seus estudos interrompidos, os quais vinham sendo realizados desde o ano de 2010; de que o apenado não escondeu o aparelho celular e deixava o estabelecimento prisional às 5h30 da manhã e retornava às 19h30, não tendo motivo para querer usar o telefone dentro da unidade.
“No que concerne ao pleito de prisão domiciliar por ser o paciente do grupo de risco para o coronavírus, tenho que o Tribunal de origem não se manifestou neste ponto (indevida supressão de instância)”, pontuou ainda o Ministro.