Defensoria obtém decisão do JVD que permite viagem internacional de mãe e filhas vítimas de violência doméstica sem autorização do pai

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.

Publicado em 19 de Janeiro de 2021 às 13:00 | Atualizado em 19 de Janeiro de 2021 às 13:00

A Defensoria Pública de SP obteve uma decisão judicial que autoriza uma mãe estrangeira e suas filhas brasileiras, vítimas de violência doméstica, a voltarem para o país de origem da mãe, sem a autorização do ex-companheiro e pai das crianças, após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhecer a competência da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher para analisar o pedido.
 
Consta nos autos que Regina (nome fictício) e suas três filhas são vítimas de violência doméstica praticada pelo ex-companheiro e pai das crianças e, mesmo após diversos atendimentos em serviços da rede de enfrentamento à violência doméstica e apoio ao imigrante, não conseguem se ver livre das investidas do agressor.
 
No processo criminal movido contra o agressor –que tramita na Vara de Violência Doméstica - as vítimas tiveram deferidas as medidas protetivas de proibição de aproximação, de contato por qualquer meio de comunicação e de frequentar os mesmos lugares que Regina e as filhas. No entanto, de acordo com o Defensor Público Anderson Almeida da Silva, que atua no caso, embora tais medidas sejam imprescindíveis, elas “não são suficientes para garantir a sobrevivência e o direito de ir e vir das pacientes, que se encontram ‘presas’ no Brasil e sem apoio da família”.
 
Por essa razão, Regina manifestou interesse em voltar ao seu país de origem com as crianças, onde encontrará apoio familiar e proteção contra as agressões do ex-companheiro. Assim, a Defensoria Pública pediu, além da fixação de guarda e da pensão alimentícia para as filhas, a autorização de viagem da mãe com as crianças, suprindo a autorização paterna, como ampliação das medidas protetivas já deferidas.
 
Na análise do pedido, a Juíza de Violência Doméstica responsável, em que pese ter deferido a guarda e pensão alimentícia, indeferiu a autorização de viagem, apontando que, por se tratar de matéria afeta à área de Infância e Juventude, não poderia decidir sobre o assunto. A Defensoria, dessa forma, apresentou habeas corpus ao Tribunal de Justiça paulista, que também indeferiu o pedido.
 
Assim, em novo habeas corpus apresentado ao STJ, o Defensor Público apontou que o Juizado de Violência Doméstica tem competência para decidir sobre o assunto, uma vez que o pedido é feito com base na violência doméstica sofrida por Regina e pelas crianças.
 
Apontou, ainda, que as medidas protetivas elencadas na Lei Maria da Penha não são exaustivas, sendo possível o deferimento de outras medidas que sejam necessárias para interromper o ciclo de violência, garantindo-se os direitos humanos das vítimas.
 
"Ao indeferir a medida protetiva de autorização de viagem, com supressão da vontade paterna, há cerceamento no direito à liberdade das pacientes, obrigando o Judiciário que elas aguardem eventual citação do agressor, em local não sabido, para procedimento de autorização, sem garantias de que estarão vivas ao final do processo ou mesmo como vão sobreviver dignamente até lá, sem rede de apoio e sem condições de sustento".
 
Na análise do habeas corpus, o Ministro Raul Araújo, do STJ, considerou que o fato de a causa de pedir ser fundada diretamente na situação de violência doméstica “confere à Vara Especializada da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher competência para apreciar os pedidos de ampliação das medidas protetivas”. Dessa forma determinou que o juízo responsável analise o pedido feito pela Defensoria Pública.
 
Em nova análise do pedido, o juízo deferiu o pleito apresentado pela Defensoria, autorizando a viagem internacional da mulher e das crianças, condicionando-a à informação de seu endereço e meios de contato (e-mail e telefone) naquele país, a fim de que possa ser contatada oportunamente.
 
O processo tramita em segredo de justiça, razão pela qual os nomes e demais informações foram ocultados ou substituídos.