Após ação da Defensoria, Justiça concede direito de alteração de registro civil de transexual sem necessidade de perícia
“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”
Após ação oferecida pela Defensoria Pública, a Justiça concedeu a uma transexual o direito de alterar seus registros e documentos, passando a usar oficialmente seu nome de mulher e assento de gênero feminino, sem a necessidade de perícia no Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo – Imesc.
Para o Defensor Público Vinicius Conceição Silva Silva, autor da ação juntamente com o Defensor Peter Gabriel Schweikert, a decisão é de grande importância pois “rompe com o paradigma patológico da transexualidade, dispensando a intervenção médica, e adota o paradigma social e psíquico fundado nas experiências socais da identidade de gênero”.
Bruna (nome fictício) nasceu com sexo biológico masculino, porém se identifica como mulher, sendo conhecida pelo nome feminino desde os 15 anos. Ela realiza tratamento hormonal para melhor adequar sua anatomia a sua real identidade de gênero e planeja em breve submeter-se a tratamento psicológico para realização de cirurgia de redesignação sexual, fatos comprovados na ação mediante apresentação de documentos como atestado médico com tratamento hormonal para adequação da personalidade, receitas médicas e contrato de implante da prótese mamária.
A retificação de nome e gênero no registro civil passou nos últimos tempos a ser autorizada sem necessidade da cirurgia da genitália, o que representou um avanço na conquista de direitos pelas pessoas transexuais. A dispensa das perícias médicas, no entanto, ainda enfrenta dificuldades. “Os juízes ainda se sentem inseguros quanto à prova da transexualidade. Por isso, esta é uma sentença muito boa e que representa um grande avanço para comunidade LGBTT”, avaliou Vinícius.
Desconforto e constrangimento
Na ação, o Defensor Público lembrou que Bruna “passa constantemente por enorme desconforto e constrangimento sempre que lhe é exigida a apresentação de documento de identidade, em especial nas situações formais que envolvem trabalho e formação profissional”. Esta situação acaba prejudicando Bruna inclusive na procura por uma colocação no mercado de trabalho, ressaltou Vinícius.
Na sentença inicial, o Juízo entendeu que a alteração do registro civil dependia da perícia pelo instituto estadual. A Defensoria Pública, no entanto, solicitou reconsideração do caso e requereu a autorização da retificação de assento sem a necessidade de perícia médica no Imesc.
Entre outras argumentações, a Defensoria destacou que a dispensa da exigência de laudo pericial resultaria em uma economia de aproximadamente um ano no tempo de espera por uma sentença de mudança de sexo. Isso porque o instituto costuma agendar as perícias em 6 meses e o resultado demora outros 6 meses, contando-se ainda o prazo para eventual impugnação e homologação. “Por isso, a demora na realização da perícia pode significar uma ‘morte social’ prolongada para as pessoas transexuais”, ressaltam os Defensores, acrescentando recente acordão do Tribunal de Justiça (TJSP), que reconhece ser prescindível a perícia médica no Imesc nos casos de retificação de assento de transexuais.
Na decisão, proferida em 3/10, o Juiz Yin Shin Long, da 3ª Vara da Família e Sucessões da Capital, acatou o pedido da Defensoria, que obteve parecer favorável do Ministério Público. “O tema aqui tratado era controvertido há poucos anos. Entretanto, atualmente encontra-se pacificado nos nossos Tribunais, com amparo no Princípio da Dignidade Humana”, avaliou o Magistrado.