Defensoria Pública de SP e Idec obtêm liminar que suspende alterações nas tarifas de vale-transporte da Capital

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.

Publicado em 27 de Maio de 2019 às 15:30 | Atualizado em 27 de Maio de 2019 às 15:30

A Defensoria Pública de SP obteve nesta segunda-feira (27/5) uma decisão liminar favorável a ação civil pública em face do Município de São Paulo, questionando os atos administrativos que alteraram as tarifas de vale-transporte na Capital, especialmente por criar distinção do valor cobrado em comparação ao Bilhete Único Comum. Ajuizada no dia 7/5, a ação foi elaborada pelo Núcleos Especializados de Defesa do Consumidor e de Habitação e Urbanismo da Defensoria em conjunto com o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec).

A Portaria nº 189/18 da Secretaria Municipal de Transportes, publicada em dezembro, previu o valor de R$ 4,57 para o vale-transporte, em patamar superior à tarifa do Bilhete Único Comum (R$ 4,30).

Além disso, em fevereiro, o Decreto Municipal nº 58.639/19 estabeleceu alterações nas condições que permitem mais de um embarque para uma única tarifa. Pela nova regra, o Bilhete Único comum permite até 4 embarques em um período de 3 horas – enquanto para os usuários de vale-transporte, são possíveis apenas 2 embarques no mesmo limite temporal. Em todas as categorias, fica permitida apenas uma integração com o Sistema Estadual de Transporte Metropolitano Metroferroviário, no período de 2 horas a contar da primeira utilização.

A Defensoria Pública e o Idec apontam, contudo, que a legislação federal veda a cobrança de tarifas diferenciadas para as categorias de Bilhete Único e de Vale-Transporte, conforme previsão expressa do art. 5º da Lei Federal nº 7.418/85. Há precedentes do Superior Tribunal de Justiça que reafirmam esse entendimento.

Além da obrigatoriedade legal de mesma cobrança da tarifa nominal, os autores da ação apontam que o número de embarques igualmente não pode ser diferenciado, de modo a manter o princípio de cobrança do mesmo patamar de tarifa – evitando que o valor do bilhete seja diminuído com o corte do número de embarques possível.  “O aumento do valor da passagem e, em especial, a redução drástica do número de embarques pode levar os empregadores a terem que arcar com o custo de deslocamento do trabalhador até o local de trabalho além do percentual de 6% de seu salário previsto em lei”, afirmam os autores da ação.

Para além dos dispositivos legais, eles destacam também que a diminuição do número permitido de embarques prejudica especialmente a população mais carente e vulnerável que vive nas áreas periféricas mais distantes do centro urbano. Nesse sentido, haveria um incentivo criado pelo Município para contratação por parte de empregadores de funcionários que tenham necessidade de realizar um número menor de embarques para chegar ao trabalho. “Além disso, há perda de competitividade dos trabalhadores de regiões mais distantes. Uma vez que os empregadores devem pagar o custo do transporte que ultrapasse 6% do salário do empregado, moradores de regiões periféricas e distantes, que necessitarão de mais conduções, serão preteridos diante daqueles trabalhadores que residam mais próximo dos locais de trabalho”, alertam.

Assim, a ação pede que o Judiciário reconheça a nulidade dos artigos que estipulam a diferença de tratamento entre o Bilhete Único comum e o de usuários de vale-transporte, determinando ao Município que adote a mesma regra para ambos. Pleiteiam também que a Prefeitura indenize os usuários que sofreram os efeitos da alteração da cobrança, bem como uma indenização por danos coletivos, em valor não inferior a R$ 8 milhões.

Decisão

Na decisão liminar, a Juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9ª Vara de Fazenda Pública da Capital, acolheu os argumentos da ação e determinou que o Município se abstenha de efetuar cobrança diferenciada de tarifa e o tratamento distindo quanto ao número de embarques entre o bilhete comum e o bilhete de vale-transporte.

“Nos termos da Lei Federal 7481/85 e Decreto Federal 95.247/87, o vale-transporte deve ser comercializado ao preço da tarifa vigente e, ainda que respeitada a autonomia do Município para legislar sobre o tema, as normas municipais não podem contrariar as de caráter nacional, motivo pelo qual a citada portaria, ao estabelecer valores diferenciados para os usuários do bilhete único comum (R$ 4,30) e aqueles do vale-transporte (R$ 4,57), desrespeitou o princípio da legalidade”, entendeu a Magistrada na decisão. Ela destacou também que as alterações violam o princípio da isonomia. “Ademais, os usuários prejudicados com tais mudanças são justamente os integrantes dos grupos de baixa renda, que auferem de 1 a 5 salários mínimos, os quais, por motivos de trabalho, fazem mais de 2 integrações e residem em bairros periféricos da cidade”, ressaltou.

Histórico

O Judiciário já tem proferido decisões no sentido proposto pela ação desde meados de março – no entanto, em sede de ações ajuizadas por indivíduos ou grupos de empregados. A ação da Defensoria em conjunto com o Idec tem o potencial de beneficiar toda a população que se utiliza do vale-transporte.

Em três ações distintas (uma proposta por um sindicato, outra por uma empresa privada e outra por um vereador e mais 3 usuários do transporte público) a liminar foi concedida suspendendo os efeitos do decreto e da portaria que causaram a distinção entre as categorias de passageiros. Essas decisões valem apenas para os propositores das respectivas ações.