Ao julgar pedido da Defensoria, STJ reconhece alegação de pobreza como suficiente para extinguir punibilidade por não pagamento da multa penal
Defensoria argumentou, entre outros, que redação anterior gerava penumbra interpretativa e inversão do ônus da prova
Defensoria alertou que a tese então vigente, ao condicionar a extinção de punibilidade à comprovação, pelo condenado, de impossibilidade de pagamento, trazia uma zona de penumbra interpretativa
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) alterou a tese que trata das pena de multa, passando a adotar o seguinte entendimento: “O inadimplemento da pena de multa, após cumprida a pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos, não obsta a extinção da punibilidade, ante a alegada hipossuficiência do condenado, salvo se diversamente entender o juiz competente, em decisão suficientemente motivada, que indique concretamente a possibilidade de pagamento da sanção pecuniária.”
O caso foi apreciado pela 3ª Seção da Corte superior a pedido da Defensoria Pública de SP, que pleiteou a extinção da punibilidade nos casos concretos apreciados e que a tese do Tema Repetitivo (em que o STJ define uma tese que deve ser aplicada aos processos nos quais é discutida idêntica questão de direito) 931 fosse alterada para prever a extinção da pena de multa cujo valor não ultrapasse o montante mínimo para a execução fiscal de débitos com a fazenda nacional, bem como para dispor, nos demais casos, que ela seja julgada extinta quando o sentenciado não puder quitá-la sem prejudicar o próprio sustento e o de sua família, cabendo à Instituição responsável pela execução provar o contrário.
A pena de multa é fixada pelo juiz da causa e consiste em pagamento à União da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa.
No pedido, a Defensoria paulista argumentou que a maioria dos valores executados da pena de multa são de pequena monta; a quase totalidade das pessoas executadas é pobre, praticamente todos os valores cobrados não são pagos, o custo da execução é maior do que o resultado por ela trazido, a função preventiva da pena é aniquilada, entre outras colocações.
O defensor Glauco Mazetto, assessor criminal e infracional da Defensoria de SP, fez a sustentação oral no julgamento. Assista aqui.
Penumbra interpretativa
A Defensoria alertou ainda que a tese então vigente, ao condicionar a extinção de punibilidade à comprovação, pelo condenado, de impossibilidade de pagamento, trazia uma zona de penumbra interpretativa, a qual propicia a negativa eterna de sua aplicação, pontuando que são necessários critérios objetivos para a prova da falta de condições de pagamento sem prejuízo da subsistência, quando ela for reclamada.
“Mais de 90% das pessoas executadas não pagaram o valor cobrado. Certamente a maior parte delas, senão quase sua totalidade, não possui condições para tanto. Isso deixa claro não só que a grande maioria das pessoas executadas é comprovadamente pobre, mas também que o valor executado claramente afetará sua subsistência”, afirma a Defensoria. “Em mais metade dos casos em que a pessoa informou dados sobre rendimentos, a execução atingirá pessoas sem qualquer renda, colaborando, assim para a manutenção de sua miséria e da sua proximidade com a criminalidade.”
Reinserção social
Além disso, a Defensoria sustenta que a não extinção da punibilidade acarreta diversos empecilhos à reinserção social, como a impossibilidade de obtenções de documentos como a carteira profissional e o acesso a programas de auxílio social.
Com esse conjunto de argumentos, a Defensoria Pública de SP sugeriu a seguinte redação para a tese: “Deve ser julgada extinta a pena de multa cujo valor não supere o montante mínimo para o ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional, e nos demais casos em que o sentenciado não possua condições de pagá-la sem prejudicar seu sustento e o de sua família, o que se verifica, nos termos do artigo 50, §2º do Código Penal, quando somente existirem as quantias referidas no artigo 833, inciso X, do Código de Processo Civil, quando o valor dos dias-multa for fixado no mínimo legal ou quando a defesa for realizada pela Defensoria Pública sem fixação de honorários, cabendo ao exequente provar o contrário nas outras hipóteses”.
Embora não tenha acolhido integramente o pedido, a 3ª Turma do STJ, aprovou por unanimidade a nova redação estipulada pelo Relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, que admite a alegação de pobreza como suficiente para a extinção da punibilidade independentemente do pagamento da pena de multa.