TJ-SP confirma absolvição de ex-catadora analfabeta por venda de CDs piratas, a pedido da Defensoria Pública

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”

Publicado em 27 de Agosto de 2015 às 10:00 | Atualizado em 27 de Agosto de 2015 às 10:00

O Tribunal de Justiça do Estado (TJ-SP) confirmou uma decisão que, a pedido da Defensoria Pública de SP, absolveu uma ex-catadora de materiais recicláveis da acusação pelo crime de violação de direito autoral. Segundo os autos do processo, ela vendeu 20 CDs e DVDs piratas em 2008, mas a corte considerou que ela não tinha consciência do crime, por ser analfabeta, ter inteligência limítrofe e transtornos psiquiátricos.
 
A mulher foi acusada de expor à venda e comercializar CDs e DVDs piratas no dia 25/6/2008, na cidade de Ribeirão Preto, conforme o artigo 184, § 2º, do Código Penal. Ela própria declarou que adquiriu 20 discos no intuito de revendê-los e obter dinheiro para alimentar a si e à família, já que não mais exercia a função de catadora de materiais recicláveis e não dispunha dessa fonte de renda.
 
Porém, a acusada demonstrou em suas declarações não ter ciência da ilicitude de seu ato, como ao dizer que não correu da abordagem da Polícia por considerar que não havia feito “nada de errado”. Testemunhas a identificaram como “catadora de papelão” e disseram desconhecer um envolvimento costumeiro dela na venda de CDs e DVDs falsificados.
 
Em exame de insanidade mental, ela foi considerada analfabeta – sabe apenas escrever o nome, mas não lê –, tem limitações cognitivas e transtornos de ansiedade, depressivo e de personalidade. A 13ª Câmara de Direito Criminal, em votação unânime, considerou que a mulher não tinha conhecimento da ilicitude de seus atos, incidindo no chamado “erro de tipo” – ou seja, ela agiu movida por uma falsa percepção da realidade, como se sua conduta não fosse tipificada como crime.
 
O Defensor Público Genival Torres Dantas Júnior argumentou que a venda de produtos piratas é conduta bastante comum, sobretudo na população mais pobre, e socialmente aceita. Ele mencionou, inclusive, um prédio criado em 1998 pelo Município de Ribeirão Preto, por este mantido e fiscalizado, onde notoriamente camelôs comercializam produtos piratas.
 
Segundo Genival, a Teoria da Adequação Social pontua que, ainda que determinada conduta seja prevista em lei como crime, ela não deverá ser assim considerada se for socialmente adequada ou reconhecida, se estiver "de acordo com a ordem social da vida historicamente condicionada". Também questionou a validade da tipificação do artigo 184, § 2º, considerando os princípios da intervenção mínima e a da ultima ratio do direito penal – ou seja, o Estado só deveria atuar na esfera penal, intervindo na esfera da liberdade das pessoas, se não houver qualquer outro meio de coibir a conduta que não se deseja ver realizada.
 
A decisão da 13ª Câmara de Direito Criminal, proferida em 21/5 e dada ao conhecimento da Defensoria Pública em 24/8, confirmou sentença de setembro de 2012, que absolveu a mulher. Naquela decisão, o Juiz Sylvio Ribeiro de Souza Neto, da 2ª Vara Criminal de Ribeirão Preto, considerou que o comércio de produtos não autorizados é extremamente difundido e que “não se pode exigir que aqueles que procuram se sustentar e alimentar aqueles que são seus dependentes, excluídos da economia formal, como se vê inserida a acusada, tenham a plena consciência de que estão violando direito autoral”.