Comissão Interamericana de Direitos Humanos avaliará caso de tortura denunciado pela Defensoria Pública de SP

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.

Publicado em 23 de Junho de 2020 às 15:00 | Atualizado em 23 de Junho de 2020 às 15:00

A Defensoria Pública de SP, por meio de seu Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos (NCDH), teve admitida pela segunda vez a análise de um pleito perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Trata-se de uma denúncia de tortura contra um homem que teria sido cometida por policiais militares, sem que o crime fosse devidamente investigado, e os responsáveis, punidos.


Encaminhado ao NCDH pela Defensora Milena Reis, o caso de 2011 foi apresentado à CIDH pelo Defensor Carlos Weis. Conforme o relato apresentado, a vítima foi presa sob acusação de roubar um carro. Após ser perseguido por dois policiais e bater o veículo, aponta a denúncia, o homem desarmado teria se rendido, mas recebido um tiro nas costas. Ainda segundo o documento, teria sido levado a um local ermo e agredido pelos policiais, com pólvora colocada em suas mãos, e sendo depois transportado a um hospital.

A mãe da vítima relatou a história à Defensoria, que solicitou a devida investigação. Em 2012, o caso foi arquivado a pedido do Ministério Público, que entendeu não ter ocorrido crime. Outro inquérito foi aberto na Justiça Militar, mas os policiais acabaram absolvidos da acusação de tentativa de homicídio perante a Vara do Júri em 2014.

Esgotados os recursos internos quanto ao crime de tortura, o NCDH submeteu o caso à CIDH.

“A falta de apuração e punição no presente caso é um exemplo do que acontece cotidianamente no Brasil e a decisão conjugada das autoridades públicas aqui referidas contribui para que não haja prevenção contra novos casos de tortura, em clara violação ao artigo 6º da Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura”, apontou a manifestação.

O NCDH aponta violação dos artigos 5 (integridade pessoal), 8 (garantias judiciais) e 25 (proteção judicial) da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, todos relacionados com seu artigo 1.1 (obrigação de respeitar os direitos), bem como dos artigos 2 e 8 da Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos prevê que a CIDH emita um relatório sobre o pedido ou submeta o caso para julgamento pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.

“Sobre o tema, tanto a Comissão como a Corte Interamericana já declararam violações aos seus artigos 1, 6 e 8 a fim de estabelecer o alcance da responsabilidade estatal em casos vinculados com a alta de investigação de atos de tortura“ afirma o texto da Comissão, ao decidir pela admissão do caso, em 12/3.

"O NCDH ressalta a sua posição contrária ao uso desmedido da força pela polícia. O dia a dia tem mostrado que a permissividade com a violência policial atinge tanto pessoas que estão efetivamente em conflito com a lei quanto as não acusadas da prática de crimes", afirma o Defensor Davi Quintanilha, coordenador auxiliar do Núcleo.

Crime de desacato

Recentemente, a CIDH já havia admitido a análise de outro caso apresentado pelo NCDH, que aponta violação da Convenção Americana de Direitos Humanos na existência do crime de desacato no ordenamento jurídico brasileiro.

Na semana passada, a tipificação do desacato foi considerada recepcionada pela Constituição de 1988 pelo Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, em sessão de julgamento virtual do Plenário finalizada na última sexta-feira (19), no âmbito da ADPF 496.

A Defensoria Pública de SP atuou no caso na condição de amicus curiae, em parceria com diversas outras Defensorias, argumentando pela não recepção do artigo 331 do Código Penal pela Constituição de 1988.