A pedido da Defensoria Pública, STJ anula decisão que condenou acusado por fatos não descritos na denúncia

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.

Publicado em 1 de Setembro de 2020 às 07:30 | Atualizado em 1 de Setembro de 2020 às 07:30

A Defensoria Pública de SP obteve uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que reconhece a nulidade de uma decisão judicial que condenou um réu por fatos não descritos na denúncia oferecida pelo Ministério Público.
 
Consta dos autos que o réu foi condenado em primeira instância pelo crime de receptação à pena de 7 anos de reclusão, em regime inicial fechado. No Tribunal de Justiça paulista (TJ-SP), a pena foi revista, impondo-se o patamar de 6 anos e 3 meses de reclusão.
 
No entanto, segundo aponta o Defensor Público Rodrigo Ferreira dos Santos Ruiz Calejon, tanto em primeira como em segunda instância não houve correlação entre o exposto na peça acusatória e a sentença condenatória, uma vez que o réu foi condenado por recepção qualificada, sem que a circunstância qualificadora tenha sido descrita implícita ou explicitamente na denúncia.
 
"É certo que na denúncia não houve qualquer descrição sobre o crime ter sido praticado no exercício de atividade comercial ou industrial. Em nenhum momento, o Ministério Público demonstrou que seria a receptação destinada ao fim comercial, tampouco deu a entender, pela descrição das condutas, qualquer ideia nesse sentido", explicou o Defensor, no habeas corpus impetrado no STJ.
 
"Trata-se, aqui, de reconhecer a violação de princípios constitucionais relativos ao devido processo legal, à inércia da jurisdição, à correlação entre acusação e sentença, ao contraditório e à ampla defesa", complementou.
 
Na análise do habeas corpus, o Ministro Ribeiro Dantas apontou que, da leitura atenta dos autos, observa-se que não se trata de simples definição jurídica diversa, e sim de “verdadeira modificação da descrição dos fatos, com o acréscimo de qualificadora não descrita na denúncia".
 
Ele também explicou que "está-se diante de mutatio libelli, que exige, para fins de observância do devido processo legal, a concessão de prazo ao Órgão acusador para aditar a denúncia e, após, novo prazo para o réu, para que se defenda desse aditamento. Sem a observância desse procedimento, imperioso concluir que o acusado não se defendeu de todos os fatos, residindo, aqui, manifesto prejuízo à ampla defesa".
 
Dessa forma, o Ministro reconheceu a nulidade absoluta da sentença que, "em descompasso com os limites traçados pela exordial acusatória, condena o réu por fatos não narrados na denúncia". Apontou, ainda, a "possibilidade de aditamento da denúncia, de forma a garantir ao paciente que se defenda de todos os fatos a ele imputados, a serem devidamente apreciados pelo Juízo de 1º grau”.