Após ação da Defensoria, STJ admite partilha de imóvel situado em loteamento irregular em processo de divórcio
“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.
A Defensoria Pública de SP obteve no Superior Tribunal de Justiça (STJ) decisão favorável ao pedido de partilha de posse de imóveis em ação de divórcio, que havia sido indeferido porque o bem se encontra em loteamento irregular. O caso ocorreu em Guarujá, no litoral paulista.
Ao ajuizar divórcio litigioso em face do marido, Gislaine (nome fictício) pleiteou a partilha, em iguais proporções, dos bens adquiridos na constância do casamento, celebrado sob o regime da comunhão parcial de bens. Trata-se de 3 imóveis residenciais situados em um mesmo terreno, sobre os quais o casal detinha direitos pessoais e possessórios e um automóvel. O Juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente os pedidos para decretar o divórcio e a partilha do automóvel, mas entendeu inviável a partilha dos imóveis, justificando que a situação de clandestinidade ou irregularidade impede que se considere tais bens, sob o aspecto formal, aptos a serem partilhados.
Após o Tribunal de Justiça do Estado proferir acordão confirmando a decisão de primeiro grau, o Defensor Alberto Zorigian GonÇalves de Souza interpôs Recurso Especial junto ao STJ. “As partes possuem tão somente direitos possessórios sobre o imóvel, assim como direitos pessoais decorrente do contrato de compra e venda juntado aos autos, sendo tais direitos o objeto da partilha almejada”, salientou o Defensor.
De acordo com Alberto, o bem em questão é o único que Gislaine possui, e negar-lhe o direito de posse redundaria em deixá-la sem moradia. “Em atenção à previsão constitucional do direito à moradia, e tendo em vista que o acesso aos bens vitais mínimos integra o núcleo do postulado da dignidade da pessoa humana, impõe-se a tutela da posse como categoria autônoma”, sustentou. “Quanto aos direitos pessoais que também se pretende partilhar, não há que se falar em objeto ilícito do contrato, pois em momento algum as partes promoveram loteamento ou pretenderam vender lote. Elas compraram, de boa-fé, direitos possessórios sobre um imóvel residencial”, acrescentou o Defensor.
Na decisão, a 3ª Turma do STJ deu provimento ao pedido, reformando o acórdão anterior. “Dada a autonomia existente entre o direito de propriedade e o direito possessório, a existência de expressão econômica do direito possessório como objeto de partilha e a existência de parcela significativa de bens que se encontram em situação de irregularidade por motivo distinto da má-fé dos possuidores, é possível a partilha de direitos possessórios sobre bem edificado em loteamento irregular, quando ausente a má-fé, resolvendo, em caráter particular, a questão que decorre da dissolução do vínculo conjugal, e relegando a segundo momento a discussão acerca da regularidade e formalização da propriedade sobre o bem imóvel”, pontuou a Relatora, Ministra Nancy Andrighi.
“A dificuldade de ver reconhecida a autonomia da posse em relação à propriedade é cotidiana na atuação cível/família. E como sabemos, a imensa maioria dos nossos usuários são apenas possuidores dos imóveis, que em geral são seus maiores bens”, comentou a Defensora Pública Fernanda Bussinger, do Núcleo Especializado de Segunda Instância e Tribunais Superiores, que fez a sustentação oral no julgamento do STJ.