Defensoria de SP obtém sentença que reconhece direito de permanência de população tradicional no Parque Estadual do Jurupará

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.

Publicado em 26 de Agosto de 2021 às 15:00 | Atualizado em 26 de Agosto de 2021 às 15:00

A Defensoria Pública de SP obteve sentença judicial em favor da população tradicional habitante do Parque Estadual do Jurupará (Peju), localizado entre os municípios de Ibiúna e Piedade, na Região Metropolitana de Sorocaba. O julgado determina a interrupção imediata de todas as ordens de reintegração das comunidades tradicionais do local.

Com 26,2 mil hectares de extensão, o equivalente a 37 mil campos de futebol, a área onde foi criada a unidade de conservação se sobrepôs a território ocupado por população tradicional caipira, cujos registros históricos de presença na região remetem a pelo menos 8 gerações, quando as primeiras famílias se estabeleceram nesta parte do sertão de Ibiúna e Piedade.

De acordo com o Plano de Manejo do Peju, a ocupação humana da área hoje pertencente ao Parque Estadual é reconhecida como parte do patrimônio histórico e cultural da região, remetendo a mais de 300 anos. Relatório técnico socioeconômico produzido pelo Núcleo Especializado de Habitação e Urbanismo da Defensoria apontou que o território é tradicionalmente ocupado, caracterizando- pela presença de população caipira tradicional, com modos de vida e de reprodução cultural próprios.

Ordens de reintegração

A partir de 2008, em meio ao processo de discussões em torno do futuro dos moradores, a Fazenda Pública do Estado passou a ajuizar ações civis públicas ambientais visando a retirada das famílias.  Diante disso, em junho de 2016, o Núcleo ajuizou ação civil pública em face do Estado, com pedido liminar de interrupção imediata de todas as ordens de reintegração, revisão do plano de manejo, elaboração de laudo antropológico para reconhecimento dos direitos territoriais de povos tradicionais caipiras, responsabilização do Estado e pagamento de indenização pelos danos materiais e imateriais causados a centenas de famílias.

“O não-reconhecimento da tradicionalidade das comunidades locais impede que as condições de vida na área se tornem viáveis. O Estado de SP tem adotado uma postura de expulsão das famílias tradicionais do Parque Estadual do Jurupará pois, além das ações civis públicas propostas, não oferece serviços essenciais básicos para que a vida digna seja usufruída por aqueles que têm direito de permanecer no local”, alertaram as Defensoras Públicas Marina Costa Craveiro Peixoto, Luiza Lins Veloso e o Defensor Rafael de Paula Eduardo Faber, que coordenavam o Núcleo à época que a ação foi proposta. As Agentes de Defensoria Tatiana Zamoner (Arquiteta) e Marilene Alberini (Socióloga) também atuaram na elaboração da ação e da condução processual.

O Poder Judiciário, no entanto, negou o pedido liminar e as remoções continuaram. Desde 2019, a Procuradoria Geral do Estado continuou pedindo o cumprimento das ordens de reintegração de posse, retirando forçosamente os moradores das suas casas, efetuando remoções forçadas e da demolição das antigas moradias e de marcos do patrimônio cultural (igrejas, capelas, escolas rurais).

Direito de permanência

Após mais de 5 anos de tramitação, a 2ª Vara da Comarca de Ibiúna publicou sentença reconhecendo os direitos de permanência no território e reprodução dos modos de vida da população tradicional caipira do Peju. Na decisão, foram contemplados os principais pedidos da Defensoria, incluindo a obrigação do Estado de produzir laudo pericial de caráter antropológico para reconhecimento da tradicionalidade da população. Também foram garantidos os direitos de participação no Conselho Consultivo do Parque e manutenção dos meios de subsistência das famílias.

“Há a necessidade de proteção dos recursos naturais necessários à subsistência de populações tradicionais, respeitando e valorizando seu conhecimento e sua cultura e promovendo-as social e economicamente; e há a necessidade de garantir às populações tradicionais cuja subsistência dependa da utilização de recursos naturais existentes no interior das unidades de conservação meios de subsistência alternativos ou a justa indenização pelos recursos perdidos”, entendeu o Juiz Luiz Fernando Angiolucci.