Após pedido da Defensoria Pública, TJ-SP extingue punibilidade de pessoa que não tem condições de pagar pena de multa
“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.
A Defensoria Pública de SP obteve do Tribunal de Justiça paulista (TJ-SP) uma decisão que aplica o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de ser desnecessário o pagamento da multa para a extinção da punibilidade, se a pessoa condenada for usuária da Defensoria Pública.
O caso foi levado ao segundo grau pela Defensora Pública Sandra Maria Shiguehara Tibano, que apontou o recente entendimento do STJ na revisão da tese jurídica do Tema 931, pelo qual os Ministros entenderam que poderá ser extinta a punibilidade de uma pessoa que cumpriu pena privativa de liberdade, mas não tem condições de pagar a sanção pecuniária imposta pela Justiça.
A Defensora também apontou que a não extinção da punibilidade gera consequências para as pessoas que já cumpriram a pena imposta pela Justiça. “A não extinção da punibilidade sem o pagamento da multa afasta os sentenciados do retorno ao mercado de trabalho formal, pois lhe é comumente exigida a apresentação de certidão judicial negativa, ou na qual conste a plena quitação das obrigações com a Justiça Criminal.
Na decisão, os Desembargadores da 7ª Câmara de Direito Criminal do TJ-SP apontaram que para a exigência do pagamento da multa, é necessário que seja feita a verificação das condições financeiras da pessoa condenada. O relator do processo, Desembargador Klaus Marouelli Arroyo, apontou, ainda, que, para os usuários da Defensoria Pública, existe a presunção de hipossuficiência, que pode ser afastada caso o Ministério Público comprove a possibilidade da realização do pagamento.
Como, no caso específico, não houve provas acerca das condições financeiras do sujeito, “não há como negar o direito à extinção da pena”, afirmou o Desembargador. Ele também citou o entendimento vinculante firmado pelo STJ no Tema 931.
Dessa forma, em votação unânime, os Desembargadores acolheram o pedido feito pela Defensoria Pública, extinguindo a punibilidade do sujeito “em razão do integral cumprimento da pena, independentemente do pagamento da pena de multa”.
Para o Defensor Público Glauco Mazetto, Assessor Criminal da Defensoria de SP, essa decisão é importante e precisa ser aplicada também em primeira instância, onde tramita a maioria dos processos de execução de pena de multa. “É necessário que essa decisão reverbere para todas as instâncias, para que a Defensoria não precise recorrer ao TJ, STJ ou STF para fazer valer um entendimento que acabou de ser consolidado; e, principalmente, para assegurar que a pessoa que sai do sistema prisional consiga efetivar a sua cidadania e não fique à margem da sociedade por uma atuação direta do Estado”, afirmou.
Tema 931
A revisão da tese jurídica do Tema 931 pelo STJ, em novembro de 2020, aconteceu após requerimento da Defensoria Pública de SP, que apontou que a punibilidade por inadimplência da sanção pecuniária atingia em especial a situação de pessoas em situação de vulnerabilidade social e egressas do sistema penitenciário, pois é este grupo que, por não ter condições de pagar a multa estabelecida em Juízo, fica impedido de exercer uma série de direitos.
A Defensoria informou que, entre janeiro de 2020 e maio de 2021, foram ajuizadas quase 74 mil ações de execução de pena de multa em SP. A partir desse dado, a foram analisadas as mais de 4 mil intimações sobre o tema recebidas no Portal eletrônico do Tribunal de Justiça do Estado (TJ-SP) sendo identificado que 53% das ações ajuizadas tratam de cobrança de multa cujo valor não ultrapassa R$ 500; 65% dizem respeito a valores que não ultrapassam R$ 1 mil; 99% dos valores não chegam ao teto de não execução pela Fazenda Estadual; 91% não alcançam o limite de não execução da Fazenda Nacional.
Impedimento ao exercício de direitos
“A não extinção da punibilidade acarreta inúmeros impedimentos de acesso a documentos e programas assistenciais essenciais para a reinclusão social e o exercício da cidadania, por meio de direitos civis e políticos”, sustentaram os Defensores Rafael Ramia Muneratti, do Núcleo Especializado de Segunda Instância e Tribunais Superiores, e Glauco Mazetto Tavares Moreira, Assessor Criminal da Instituição. “Tal postura viola os valores mais comezinhos do Estado Democrático de Direito, que tem na dignidade da pessoa humana um dos seus fundamentos e atinge mortalmente a função precípua da pena.”
Além do Núcleo de Segunda Instância e Tribunais Superiores e da Assessoria Infracional e Criminal, também atuaram no caso o Núcleo Especializado de Situação Carcerária, a 1ª Subdefensoria Pública-Geral, a Defensora Mônica de Mello e os defensores Gustavo Junqueira e Saulo Dutra.
Eles destacaram alguns exemplos de auxílios e benefícios sociais e assistenciais de que as pessoas egressas do sistema prisional que não tinham dinheiro para o pagamento da multa ficariam alijadas, além da impossibilidade de ingressar no mercado de trabalho, exercer seus direitos políticos, entre outros. “Diante de todo esse quadro, é evidente que a função da pena não será observada, mais especificamente, sua função de prevenção especial positiva.”
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