Defensoria pede na Justiça estruturação da Defesa Civil de São Sebastião para fazer frente a eventos climáticos
Primeira ação judicial no Brasil que trata da estruturação da Defesa Civil, com fundamento nas mudanças climáticas e no racismo ambiental, considera a tragédia da Vila Sahy e a ausência de profissionais especializados no município
Homem anda em meio a lama causada por desmoronamentos na Vila Sahy
A Defensoria Pública de SP ajuizou uma ação civil pública (ACP) pedindo que a Justiça obrigue o Município de São Sebastião, no litoral norte paulista, a efetuar a estruturação da Defesa Civil municipal a fim de adaptar-se aos efeitos das mudanças climáticas, potencializados pelo racismo ambiental, que afetam principalmente as comunidades marginalizadas, como pessoas negras, indígenas e pobres.
A ação, proposta pelo defensor público Filovalter Moreira dos Santos Junior, apresenta três solicitações principais para serem atendidas no prazo de 120 dias: um estudo que identifique os serviços técnicos necessários em quantidade e especificidade suficientes para atender todas as áreas de risco existentes; a reestruturação da Defesa Civil com a implementação de um quadro funcional composto por profissionais com atribuições técnicas e operacionais específicas; e a implantação de uma base fixa localizada na Costa Sul do município, com todos os materiais, insumos, equipamentos, veículos e demais itens essenciais para o atendimento de prevenção, monitoramento, urgência e emergência e mitigação de danos. Atribui-se o valor de R$ 1 milhão à causa.
Probabilidade de novos eventos extremos
Foram levados em conta pelo defensor fatores relacionados à deficiência do serviço durante as enchentes ocorridas em São Sebastião em fevereiro de 2023 e a necessidade de maior preparação dos órgãos municipais frente às mudanças climáticas e a probabilidade de incidência de eventos extremos. Filovalter observa que "deve-se reconhecer e identificar as estruturas de funcionamento estatal, no caso da Defesa Civil, há que se estruturá-la tecnicamente, principalmente para atuação no campo da prevenção e mitigação de danos, com um quadro de agentes públicos permanentes composto por especialistas no campo das ciências, tais como: geologia, geotecnia, meteorologia, hidrologia, sociologia, analista de riscos, psicologia de desastres, sociologia etc., isto em consonância com as necessidades das comunidades, especialmente aquelas que vivem em áreas de risco, levando-se especialmente em consideração os fatores psicossociais, evitando-se, assim, que seja perpetuada essa condição de discriminação na alocação de recursos públicos, que retroalimenta o racismo ambiental, e com o objetivo de propiciar segurança e construir um bem-estar que favoreça também as populações vulneráveis.”.
Atualmente, conforme consta na ação, a Defesa Civil de São Sebastião conta com um reduzido quadro de funcionários sem especialistas em áreas técnicas e uma grande quantidade de imóveis em risco: são 2.043 em áreas com risco de deslizamentos/corrida de massa e 4.032 em áreas com risco de inundação/alagamento.
Emergência climática
De acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM), agência especializada da ONU, o ano de 2023 foi caracterizado por recordes em riscos climáticos na América Latina. De acordo com o mesmo documento, somente no Brasil foram registrados 12 (doze) eventos climáticos extremos em 2023, sendo que ao todo mais de 11 milhões de pessoas foram afetadas diretamente e 909 morreram.
Segundo o IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), o período estimado de recorrência das chuvas em São Sebastião era de 25 anos. No entanto, passados menos de 10 anos da chuva mais forte em 2014, (400 mm), outra a superou em 2023, com chuvas que ultrapassaram 600 mm.
Em fevereiro de 2023, o litoral norte de SP registrou o maior temporal ocorrido em um intervalo de 24 horas na história do país, segundo dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
São Sebastião foi o município mais prejudicado e a Vila Sahy foi a mais atingida por deslizamentos de terra, ficando totalmente destruída. Ao todo foram 65 mortes, sendo 64 pessoas na Vila Sahy e uma morte em Ubatuba.
A Defensoria vem acompanhando o caso e tem prestado atendimento à população desde fevereiro de 2023. Confira: