Defensoria obtém decisão que interrompe remoção de favela próxima à ponte estaiada
“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”
Publicado em 4 de Abril de 2008 às 13:00 | Atualizado em 4 de Abril de 2008 às 13:00
A Defensoria Pública do Estado obteve, ontem (03/04), decisão na 13.ª Vara da Fazenda Pública em ação civil pública que interrompe a remoção, pela Prefeitura de São Paulo, das 800 famílias moradoras da favela Jardim Edite, localizada na Avenida Jornalista Roberto Marinho e próxima da ponte estaiada. Pela decisão fica vedada ainda a demolição das construções, até decisão final, sob pena de multa diária de 10 mil reais em caso de descumprimento.
A Prefeitura iniciou em outubro de 2007 a oferta às famílias de um cheque-despejo no valor de 5 a 8 mil reais ou moradia no conjunto habitacional da CDHU no Campo Limpo - a 18 km da favela - para retirada dos moradores. Cerca de 500 famílias aceitaram uma das três alternativas propostas pela Prefeitura e 300 famílias permaneceram reivindicando moradia digna no mesmo local.
A área onde está instalada a comunidade, afetada pelo programa de intervenção urbanística do município para implementar um complexo viário ligando a Avenida Jornalista Roberto Marinho à Marginal do Rio Pinheiros, é classificada pelo Plano Diretor como ZEIS – 1 (Zona Especial de Interesse Social). Segundo o defensor público Carlos Henrique Loureiro, que assina a ação, “por ser uma ZEIS e estar em área da Operação Urbana Água Espraiada, é obrigação do Município construir moradias populares na região para atender todos os moradores do Jardim Edite com recursos dos CEPACs [Certificados de Potencial Adicional Construtivo], não podendo conceder “cheque-despejo” ou qualquer outra alternativa habitacional que não a estabelecida em lei”.
O líder comunitário Gerôncio Henrique Neto, que mora na comunidade há mais de 40 anos, argumenta que já foram arrecadados milhões de reais com os CEPACs e afirma que tem esperança de conquistar definitivamente moradia digna na região, “porque a lei me garante”.
Relatório da EMURB sobre a Operação Urbana Água Espraiada, referente ao último trimestre de 2007, indica que já foram gastos, nas obras viárias, 182 milhões de reais com recursos dos CEPACs. Na rubrica “Habitações de Interesse Social”, o relatório indica apenas que as obras estão “em estudo”.
O juiz da 13º Vara da Fazenda Pública acolhe argumentos e o pedido liminar feito pela Defensoria na ação e afirma que “impõe-se a intervenção judicial com finalidade de garantir a tais famílias uma efetiva e concreta política habitacional que não se limite ao cheque de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). A Lei n.º 13.260/01, que regula a operação urbana em comento, prevê o reassentamento definitivo das famílias atingidas pela obras (art. 3.º), enquanto o Estatuto da Cidade também exige um programa de atendimento econômico e social para a população diretamente afetada pela operação (art. 33, III, da Lei n.º 10.257/2001).
A ação também contou com parecer favorável do Ministério Público Estadual aos pedidos feitos pela Defensoria.
Saiba mais:
Histórico
A comunidade começou a se instalar no local na década de 60, metade das 800 famílias residiam na área há mais de 10 anos.
Argumentos e pedido liminar da Defensoria na ação civil pública
a) Argumentos da Defensoria:
“A lei específica da operação urbana deve conter um programa de atendimento econômico e social para a população diretamente afetada pela operação (art. 33, inc. III da Lei 10.257/01). Tal programa, em relação à Operação Urbana Água Espraiada, resta desenvolvido no art. 3º, inc. III da Lei Municipal 13.260/01, que prevê a implantação de unidades de Habitação de Interesse Social - HIS, melhoramentos e reurbanização, assegurando-se o reassentamento definitivo das famílias atingidas pelas obras e outras intervenções previstas nesta lei, no perímetro da Operação Urbana Consorciada.”
“A toda e maior evidência, o atendimento habitacional em pecúnia decorrente da Portaria 138/06 SEHAB e Ordem Interna PREF 01/2006 não pode ocorrer, pois, para além do fato de não proporcionar atendimento habitacional efetivo, face ao baixo valor do benefício, não promove a regularização urbanística e fundiária das áreas ocupadas pela população de baixa renda integrantes da Operação Urbana: daí que não se legitime como instrumento da política urbana, tendente a combater a marginalidade e a exclusão social.”
b) Pedido liminar da Defensoria:
“A concessão de liminar, para determinar a Ré [Município] que interrompa a operação urbanística no Jardim Edite, consistente na demolição das construções, com a remoção das famílias, a fim de viabilizar a implantação de complexo viário, com pontes, interligando a Avenida Água Espraiada com as marginais do Rio Pinheiros, nos termos do art. 3º, ‘d’ da Lei Municipal 13.260/01, através da oferta de Verba de Atendimento Habitacional [cheque despejo], prevista na Portaria 138/06 da SEHAB e Ordem Interna PREF 01/06, sob pena de multa diária, nos termos do art. 11 da Lei 7.347/85, de R$ 10.000,00;
CEPACs
São instrumentos de captação de recursos para financiar obras públicas. Os investidores interessados compram do poder municipal o direito de construir além dos limites normais em áreas que receberão ampliação da infra estrutura urbana.