Inspeção feita no CRP de Presidente Bernardes denuncia condições inadequadas das celas
“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”
O defensor público Carlos Weis, membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), divulgou nesta quinta (7/12) o relatório da inspeção realizada no Centro de Readaptação Penitenciária (CRP) de Presidente Bernardes.
Weis visitou o CRP no dia 21 de novembro, acompanhado pelo diretor do estabelecimento, Luciano César Orlando, e teve acesso a todas as instalações da unidade penal. A inspeção foi motivada pela notícia de que presos teriam iniciado greve de fome contra as condições do local e por denúncia formulada à Ouvidoria do Departamento Penitenciário Nacional questionando a salubridade do ambiente. Todos os presos do CRP são submetidos ao Regime Disciplinar Diferenciado (RDD).
A denúncia apontava que a instalação de chapas de aço nas janelas prejudicou a entrada de luminosidade nas celas, assim como a ventilação e o condicionamento térmico; que o cheiro de tinta fresca nas celas era intenso; que a reforma do parlatório impedia o devido contato visual e auditivo entre o preso e as visitas; e que os presos em greve de fome seriam enquadrados como violadores da disciplina penitenciária.
Durante a visita, Weis constatou que a instalação das chapas de aço não prejudicou a entrada de luminosidade. A substituição dos vidros transparentes pelos vidros jateados, contudo, trouxe graves conseqüências ao impedir a visão dos presos. A impossibilidade de ver com nitidez o exterior, para o defensor, aumenta consideravelmente a sensação de isolamento e impede que o preso olhe a uma distância superior a três metros, ameaçando sua integridade física e mental.
“As celas, já nas dimensões mínimas admitidas em lei, são pintadas inteiramente de branco, assim como as portas. Neste conjunto, as janelas, ao impedirem que o preso veja com nitidez o exterior, acabam reduzindo seu campo de visão a uma única cor, o branco, o que seria distinto caso as janelas fossem transparentes, pois seria possível divisar o gramado verde que separa a cela da muralha e as tonalidades do céu”, afirma o relatório. “A impossibilidade de olhar a uma distância superior a três metros e o entorno inteiramente branco gera sérias preocupações quanto à sanidade mental e ótica dos presos que, por lei, são obrigados a permanecer em tal ambiente por 22 horas diárias, por até 360 dias”.
No quesito ventilação, Weis identificou que as reformas introduzidas após agosto de 2006, em geral, melhoraram as condições, contudo defendeu a realização de um estudo técnico para verificar se a aeração e temperatura são adequadas à existência humana. Tal estudo se mostra especialmente necessário quando considerada a elevada média de temperatura da região oeste de São Paulo.
O defensor identificou uma leve presença de odor de tinta nas celas visitadas, indicando que o odor poderia ser intenso na época em que os presos foram transferidos para as instalações recém-reformadas. “Além disso, os presos permanecem 22 horas trancados, o que potencializa a sensação olfativa indicada”, afirmou Weis.
A denúncia de que a comunicação nos parlatórios era falha, segundo Weis, não procede. Apesar da instalação de vidros e grades que impedem o contato físico entre o preso e as visitas, a visualização e a comunicação são claras. O defensor destaca que o impedimento do contato físico é uma medida extrema, mas não ultrapassa os limites legais neste aspecto.
Weis considerou insuficiente o esforço de ressocialização encontrado na unidade penal. A única atividade permitida é a leitura, mas cerca de 80% dos presos paulistas não concluíram o ensino básico, o que limita a eficácia do recurso. Para o defensor, o CRP deveria desenvolver atividades que abram novas perspectivas de vida e de orientação moral e ética aos presos.
“Tratando-se de pessoas que, supostamente, transgrediram com maior gravidade as regras legais de conduta e que, igualmente, podem pertencer a grupos criminosos organizados, com maioria de razão é de se supor que o Estado encete medidas capazes de propiciar-lhes novas opções, ao invés de buscar apenas a dissuasão de suas condutas pela imposição de castigos severos”, afirmou.
Weis condenou a instauração de sindicância contra os presos que realizaram a greve de fome, por violação da disciplina penitenciária. Para ele o uso de tal expediente é uma manifestação legítima da liberdade de expressão do pensamento que não pode ser reprimida durante a condenação criminal. “A simples realização de greve de fome é ato que não compromete a segurança da unidade ou mesmo do sistema penitenciário, antes se revestindo de mecanismo político de expressão do pensamento e das convicções, largamente utilizado na história da humanidade”, declarou no relatório, entre outras conclusões e sugestões.
Weis destaca que o CNPCP elaborou parecer em 2004 no qual conclui pela inconstitucionalidade do RDD. O isolamento celular por 22 horas diárias, para o Conselho, viola a Constituição da República, as Regras Mínimas para o Tratamento de Presos da Organização das Nações Unidas e as normas de interpretação da Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes das Nações Unidas.
O RDD, segundo o parecer, também ofende o dever constitucional de o Estado respeitar a integridade física e moral dos presos, além de não propiciar oportunidade de reintegração social do condenado, um dos objetivos do cumprimento de pena.
“A realização da inspeção, assim como as conclusões e recomendações, não significam revisão desta posição e nem admitem que a unidade penal esteja de acordo com as orientações do Conselho. No entanto, algumas medidas podem ser tomadas para minorar a situação de violação da dignidade humana, sem prejuízo da segurança”, afirmou Weis.
Saiba mais:
O CNPCP tem por atribuições propor diretrizes da política criminal para a prevenção do delito, administração da Justiça Criminal e execução das penas e das medidas de segurança; promover a avaliação periódica do sistema criminal para a sua adequação às necessidades do País e inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais.
Coordenadoria de Comunicação e Assessoria de Imprensa