Em ação da Defensoria Pública, TJSP determina implementação de educação diferenciada em comunidade quilombola de Bombas
Decisão observa que plano educacional deve considerar peculiaridades dos quilombolas, para evitar o apagamento de sua história
Foto: Anna Maria Andrade/ Instituto Socioambiental
Uma decisão da Câmara Especial do Tribunal de Justiça de SP (TJSP) reitera sentença obtida pela Defensoria Pública de SP em primeira instância e mantém a determinação para que o poder público preste serviço educacional gratuito e diferenciado a crianças, adolescente e jovens adultos na comunidade quilombola de Bombas, no município de Iporanga, na região do Vale do Ribeira.
A ação civil pública foi proposta em 2017 pelo defensor público Andrew Toshio Hayama, que apontou que a educação diferenciada é uma modalidade voltada a comunidades tradicionais, para que a elas sejam asseguradas condições de igualdade, respeito e adequação às particularidades que caracterizam cada grupo. Assim, a educação para a comunidade quilombola “deve garantir que as coletividades assumam paulatinamente a responsabilidade pela construção e gestão do planejamento educacional, primando por um ensino adequado às peculiaridades destas comunidades”, afirmou, na ação, o defensor.
Em sustentação oral realizada na última segunda-feira (12/12), o defensor público Julio Grostein, do Núcleo de Segunda Instância e Tribunais Superiores da Defensoria Pública, pontuou que a comunidade quilombola de Bombas é extremamente isolada e historicamente alijada de políticas públicas essenciais. "A falta de educação básica vem causando sérios prejuízos à cultura e modo de vida de seus membros, ante a necessidade de que crianças e adolescentes tenham que deixar o quilombo para estudar na área urbana de Iporanga/SP".
No julgamento de recurso apresentado pelo Estado contra a decisão de primeira instância, desembargadores e desembargadoras da Câmara Especial do TJSP observaram que a efetivação do direito fundamental à educação deve ser assegurada com absoluta prioridade, conforme previsão da Constituição Federal, e que a ausência de educação diferenciada na comunidade quilombola configura mora do poder público.
"Não custa destacar que as Comunidades Quilombolas em nosso país ainda sofrem cotidianamente com o estigma do preconceito e o peso de nossa herança histórica escravagista. Não por outro motivo, a legislação de vigência reserva especial atenção ao desenvolvimento educacional destas comunidades. Nestes objetivos incluem-se, para além do desenvolvimento pedagógico, a preocupação com a preservação de tradições e elementos e étnico-culturais destas comunidades. Isso porque, como bem pontuou a Defensoria, por vezes a omissão Estatal pressiona a juventude destas comunidades a abandonarem os Quilombos, rompendo seus laços familiares, culturais e étnicos e favorecendo o fenômeno de apagamento destas comunidades e de sua história. O Estado e a política educacional não podem ser coniventes com esta situação", pontuaram os/as desembargadores/as.
Saiba mais
Consta nos autos que a comunidade quilombola de Bombas nunca recebeu serviço educacional de forma completa. “Apenas os anos iniciais do ensino fundamental são prestados pelo poder público. Os anos finais do ensino fundamental e o ensino médio nunca foram executados”, explicou o defensor Andrew Toshio Hayama.
Na ação, ele também explica que a educação escolar diferenciada quilombola já foi regulamentada pelo Conselho Nacional de Educação, por meio da Resolução nº 8, de 2 de novembro de 2012, que prevê a construção de escolas públicas em territórios quilombolas, presença preferencial de professores e gestores quilombolas, elaboração de projeto pedagógico que incorpore questões e valores da comunidade, participação de estudantes, pais, mães e lideranças comunitárias na gestão escolar, etc.
Segundo dados da Unicef apresentados na ação, as populações quilombolas estão entre os grupos mais atingidos pela exclusão escolar, tendo em vista que a maior parte se situa em áreas rurais.