Em caso que levou a afastamento de funcionários da Fundação Casa, TJ-SP decide que Defensoria pode ajuizar ação coletiva em vara da infância e juventude contra agressões a adolescentes internados
“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”
A Defensoria Pública obteve na última segunda (5/3) uma decisão da Câmara Especial do TJ-SP que reconheceu que a instituição pode manejar ações civis públicas perante varas da infância e juventude para pleitear medidas que visem tutelar os direitos de adolescentes internados. A decisão foi proferida em sede de um conflito de competência suscitado pela Vara da Infância e Juventude de Santana em face do Departamento de Execuções da Infância e Juventude na Capital.
O caso que levou à recente decisão do TJ-SP já tinha tido por desdobramento uma decisão liminar judicial, do último mês de novembro, que determinou o afastamento de funcionários da Fundação CASA na Capital, após apuração de relatos de agressões contra adolescentes.
Histórico do caso
Já então responsável pelo caso, a decisão da Vara da Infância e Juventude do Foro de Santana foi relativa a uma das unidades do complexo Vila Maria e tomada após ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública, baseada na coleta de relatos e imagens de adolescentes, após entrevista com Defensores Públicos, bem como relatórios de inspeções à unidade e laudos médicos indicando a existência de lesões.
“Pelos relatos apresentados pelos internos, verifica-se que as agressões são corriqueiramente utilizadas como forma de ‘correção’ e ‘disciplina’ dos adolescentes que ali cumprem medida socioeducativa. As agressões são relatadas de maneira bastante análoga e repetitiva, o que revela que a prática parece estar consolidada entre os funcionários da unidade”, apontou a ação.
A decisão liminar culminou com o afastamento de quatro funcionários da unidade, após destacar que as mídias anexadas ao processo comprovavam agressões e ameaças com cadeiras. As imagens são de outubro de 2016. Após a decisão liminar, a Fundação Casa também afastou o Diretor responsável pela unidade.
Competência
Ainda assim, restava pendente a definição pelo TJ-SP sobre se a Defensoria poderia manejar uma ação civil pública em varas de infância para pleitear a imposição de sanções administrativas (como interdição de Unidade e afastamento de funcionários), além de condenação ao pagamento de indenização por danos morais coletivos e individuais decorrentes das agressões.
Na decisão desta semana, o Presidente da Seção de Direito Privado, Campos Mello, destacou que “a Defensoria Pública tem legitimidade para a propositura de ACP que vise à tutela de direitos difusos e coletivos de pessoas necessitadas”, apontando que os pedidos de sanções administrativas, bem como indenizatórios, extrapolavam a competência do Departamento de Execuções da Infância e Juventude na Capital (DEIJ) de simples atividade fiscalizatória de natureza administrativa.
“Portanto, os pedidos formulados pela Defensoria Púbica na ação civil pública extrapolaram o âmbito fiscalizatório e, em consequência, retiram a competência do Juízo do Departamento de Execuções da Infância e Juventude da Capital. Tampouco prospera a alegação do Juiz suscitado de que, ainda que não reconhecida a competência do DEIJ, a demanda deveria ter sido proposta na Vara Central, onde está localizada a sede da Fundação Casa”, aponta a decisão, tomada também pelos Desembargadores Artur Marques (Vice-Presidente) e Fernando Torres Garcia (Presidente da Seção de Direito Criminal).
“Embora o artigo 191 do Estatuto da Criança e do Adolescente preveja que o procedimento para apuração de irregularidades terá início mediante portaria judicial ou representação do Ministério Público ou do Conselho Tutelar, nada impede que outros instrumentos processuais sejam utilizados na defesa dos interesses dos adolescentes, e a ação civil pública é um deles”, destacaram.
A ação civil pública foi assinada pelos Defensores Daniel Palotti Secco, Yolanda de Salles Freire César, Samuel Friedman, Fernanda Penteado Balera, Claudia Abramo Ariano, Ligia Cintra Trindade, Adriana Issa Peres e Gabriela Pimenta. Contou também com apoio e atuação do Núcleo Especializado de Segunda Instância e Tribunais Superiores da Defensoria com relação ao julgamento do conflito de competência no TJ-SP.