Defensoria obtém decisão do TJ que tranca processo contra mulher acusada de aborto, após exame de DNA comprovar que feto não era dela

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.

Publicado em 8 de Outubro de 2020 às 08:00 | Atualizado em 8 de Outubro de 2020 às 08:00

Por meio de habeas corpus ao Tribunal de Justiça de SP (TJSP), a Defensoria Pública obteve uma decisão que determinou o trancamento do processo criminal contra uma jovem que havia sido denunciada pela prática de aborto, após ficar comprovado por exame de DNA que o feto não era dela.
 
A mulher foi acusada de utilizar medicamentos abortivos para expelir o feto em outubro de 2018. No entanto, o TJSP reconheceu a impossibilidade de comprovar a materialidade do delito, já que, apesar de a perícia ter demonstrado o abortamento, a análise genética feita na jovem e no feto excluiu a hipótese de maternidade. A denúncia do Ministério Público havia sido feita já com essa informação nos autos.
 
A perícia também apontou a ausência de elementos para determinar se o aborto foi espontâneo ou provocado.
 
Assim, por unanimidade, a 14ª Câmara de Direito Criminal do TJSP determinou o trancamento da ação penal, concedendo a ordem do habeas corpus formulado pela Defensora Pública Ana Rita Souza Prata, integrante do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudem). O caso também contou com atuação da Defensora Juliana Garcia Belloque, integrante do Núcleo Especializado de Segunda Instância e Tribunais Superiores.
 
Atuação em acusações de aborto
 
A Defensoria Pública de SP, por meio do Nudem, tem levado à frente desde 2017 um projeto para garantir defesa técnica e afastar acusações pelo crime de aborto contra mulheres carentes.
 
Já foram impetradas dezenas de habeas corpus junto ao TJSP, argumentando pela inconstitucionalidade da criminalização até o terceiro mês de gestação – conforme precedente de novembro de 2016 da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com a decisão, a criminalização nesse período fere direitos sexuais e reprodutivos, o direito à autonomia, à integridade física e psíquica, bem como o direito à igualdade. Saiba mais
 
As ações também destacam que informações de atendimentos de saúde enviadas à polícia violam o sigilo entre médico e paciente e, por isso, são provas ilícitas. Sob esse argumento, o TJSP já acatou ação da Defensoria para afastar a acusação de aborto contra uma jovem de 21 anos.
 
De acordo com levantamento do Nudem, a maior parte das denúncias contra mulheres que procuram o sistema de saúde parte de profissionais da área envolvidos no atendimento. Por isso, Conselhos profissionais (como de Medicina) têm sido instados para que apurem rompimento do dever ético de sigilo.
 
“Além de atuar em cada caso identificado, realizamos estudo que demonstra que o perfil de mulheres acusadas criminalmente por aborto é, invariavelmente, de mulheres carentes, com baixa escolaridade e residentes em áreas periféricas, muitas negras e pardas. Entendemos que a falta de acesso a meios abortivos seguros as coloca em situação de risco e marginalidade, reforçando o recorte de classe e raça que resulta da criminalização”, dizem as Defensoras Paula Sant'Anna Machado de Souza e Nalida Coelho Monte, da coordenação do Nudem.
 
O resultado do levantamento já foi levado a uma audiência pública promovida pelo STF na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 442, que debate a descriminalização do aborto.
 
Outro trabalho realizado pelo Nudem é acompanhar as políticas públicas de abortamento legal a fim de garantir esse direito a meninas e mulheres nos casos previstos em lei. Para saber mais sobre esse direito, acesse nossa cartilha “Direitos Reprodutivos: Aborto Legal”.