Execução penal: Em habeas corpus da Defensoria Pública de SP, STF determina que crime de "associação para o tráfico" não seja óbice à progressão especial de regime
“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.
A Defensoria Pública de SP obteve uma decisão do Supremo Tribunal Federal que reconhece a possibilidade de progressão especial de regime para uma mulher condenada pelo crime de associação para o tráfico, como prevê o artigo 112, §3º da Lei de Execução Penal (LEP - Lei nº 7.210/84). O benefício estava sendo negado a ela por divergência na interpretação deste dispositivo, que permite a progressão de mulheres grávidas ou responsáveis por crianças ou pessoas com deficiência, que não tenham integrado organização criminosa.
Segundo consta nos autos, a mulher foi condenada por tráfico e associação para o tráfico (artigos 33 e 35 da Lei de Drogas), tendo já cumprido mais de 1/8 de sua pena em regime fechado - o que permitiria a ela progredir para o regime semiaberto. No entanto, o juiz da execução penal e o Tribunal de Justiça de São Paulo negaram o benefício, apontando que o crime de "associação para o tráfico" é semelhante ao crime de "associação criminosa".
No entanto, para o Defensor Público Rafael Rodrigues Veloso, que atuou no caso, os tipos penais “associação para o tráfico” (artigo 35, da Lei 11.343/2006) e de “integrar organização criminosa” (art. 1º, § 1º, da Lei n. 12.850/2013) são distintos, e não pode ser feita analogia entre os crimes de modo a prejudicar a mulher, uma vez que os crimes não são equivalentes.
Dessa forma, o Defensor impetrou pedido de habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ) - que não foi apreciado - e, então, apresentou novo habeas corpus para o STF.
Na análise do pedido, o Ministro Edson Fachin apontou que a Suprema Corte já refutou atribuir ao crime de "organização criminosa" conceituação sinônima ou congênere ao crime de "integrar associação criminosa" ou "associação para o tráfico". Assim, apontou que "a lei somente veda a concessão de progressão especial à condenada que tenha integrado organização criminosa, não abrangendo a apenada que tenha participado de associação criminosa (art. 288 do CP) ou associação para o tráfico (art. 35 da Lei 11.343/2006)".
O Ministro também apontou que, em observância ao princípio da legalidade estrita, é vedada a analogia in malam partem (para prejudicar o apenado). "Se, como bem pondera o Tribunal de origem, houve, por parte do legislador, 'incoerência legislativa', ou, se como pontuou o STJ, 'o ordenamento jurídico brasileiro, possui mais de uma definição para o que vem a ser uma organização criminosa', deve-se, de toda sorte, tomar o termo em sua acepção mais favorável à acusada, em atenção ao princípio do favor rei."
Nesse sentido, deferiu ordem liminar de habeas corpus, determinando que seja implementado "em definitivo nova análise de progressão de pena da paciente, abstendo-se de considerar o crime de associação para o tráfico como óbice à progressão especial de regime" prevista na LEP.
Para o Defensor Rafael Rodrigues Veloso, “trata-se de uma vitória que homenageia não só o princípio da legalidade estrita em âmbito penal e processual penal, implementando-se direitos e garantias fundamentais da sentenciada no decorrer do cumprimento de sua pena privativa de liberdade; referido acórdão do STF também acaba protegendo o direito à convivência familiar e comunitária que os filhos da sentenciada possuem, circunstância que vai ao encontro do objetivo primordial da execução penal, qual seja proporcionar condições para a harmônica (re)integração social”.