Vale do Ribeira

Em ação da Defensoria Pública, TJSP determina implementação de educação diferenciada em comunidade quilombola de Bombas

Decisão observa que plano educacional deve considerar peculiaridades dos quilombolas, para evitar o apagamento de sua história

Publicado em 16 de Dezembro de 2022 às 17:57 | Atualizado em 16 de Dezembro de 2022 às 17:57

Foto: Anna Maria Andrade/ Instituto Socioambiental

Foto: Anna Maria Andrade/ Instituto Socioambiental

Uma decisão da Câmara Especial do Tribunal de Justiça de SP (TJSP) reitera sentença obtida pela Defensoria Pública de SP em primeira instância e mantém a determinação para que o poder público preste serviço educacional gratuito e diferenciado a crianças, adolescente e jovens adultos na comunidade quilombola de Bombas, no município de Iporanga, na região do Vale do Ribeira.
 
A ação civil pública foi proposta em 2017 pelo defensor público Andrew Toshio Hayama, que apontou que a educação diferenciada é uma modalidade voltada a comunidades tradicionais, para que a elas sejam asseguradas condições de igualdade, respeito e adequação às particularidades que caracterizam cada grupo. Assim, a educação para a comunidade quilombola “deve garantir que as coletividades assumam paulatinamente a responsabilidade pela construção e gestão do planejamento educacional, primando por um ensino adequado às peculiaridades destas comunidades”, afirmou, na ação, o defensor.
 
Em sustentação oral realizada na última segunda-feira (12/12), o defensor público Julio Grostein, do Núcleo de Segunda Instância e Tribunais Superiores da Defensoria Pública, pontuou que a comunidade quilombola de Bombas é extremamente isolada e historicamente alijada de políticas públicas essenciais. "A falta de educação básica vem causando sérios prejuízos à cultura e modo de vida de seus membros, ante a necessidade de que crianças e adolescentes tenham que deixar o quilombo para estudar na área urbana de Iporanga/SP".
 
No julgamento de recurso apresentado pelo Estado contra a decisão de primeira instância, desembargadores e desembargadoras da Câmara Especial do TJSP observaram que a efetivação do direito fundamental à educação deve ser assegurada com absoluta prioridade, conforme previsão da Constituição Federal, e que a ausência de educação diferenciada na comunidade quilombola configura mora do poder público. 
 
"Não custa destacar que as Comunidades Quilombolas em nosso país ainda sofrem cotidianamente com o estigma do preconceito e o peso de nossa herança histórica escravagista. Não por outro motivo, a legislação de vigência reserva especial atenção ao desenvolvimento educacional destas comunidades. Nestes objetivos incluem-se, para além do desenvolvimento pedagógico, a preocupação com a preservação de tradições e elementos e étnico-culturais destas comunidades. Isso porque, como bem pontuou a Defensoria, por vezes a omissão Estatal pressiona a juventude destas comunidades a abandonarem os Quilombos, rompendo seus laços familiares, culturais e étnicos e favorecendo o fenômeno de apagamento destas comunidades e de sua história. O Estado e a política educacional não podem ser coniventes com esta situação", pontuaram os/as desembargadores/as.
 
Saiba mais
 
Consta nos autos que a comunidade quilombola de Bombas nunca recebeu serviço educacional de forma completa. “Apenas os anos iniciais do ensino fundamental são prestados pelo poder público. Os anos finais do ensino fundamental e o ensino médio nunca foram executados”, explicou o defensor Andrew Toshio Hayama.
 
Na ação, ele também explica que a educação escolar diferenciada quilombola já foi regulamentada pelo Conselho Nacional de Educação, por meio da Resolução nº 8, de 2 de novembro de 2012, que prevê a construção de escolas públicas em territórios quilombolas, presença preferencial de professores e gestores quilombolas, elaboração de projeto pedagógico que incorpore questões e valores da comunidade, participação de estudantes, pais, mães e lideranças comunitárias na gestão escolar, etc.
 
Segundo dados da Unicef apresentados na ação, as populações quilombolas estão entre os grupos mais atingidos pela exclusão escolar, tendo em vista que a maior parte se situa em áreas rurais.