Direitos das mulheres

Após pedido da Defensoria Pública de SP, mulher submetida a esterilização compulsória receberá indenização de R$ 100 mil

“A liberdade do próprio corpo é elemento essencial da dignidade humana” afirmou Juiz, que determinou que Estado indenize por danos morais mulher que passou por processo de laqueadura sem o seu consentimento

Publicado em 8 de Julho de 2022 às 17:55 | Atualizado em 8 de Julho de 2022 às 17:55

Prática fere desde normativas internacionais de proteção aos direitos humanos das mulheres até a Constituição Federal, a Lei do Planejamento Familiar e os direitos fundamentais das mulheres

Prática fere desde normativas internacionais de proteção aos direitos humanos das mulheres até a Constituição Federal, a Lei do Planejamento Familiar e os direitos fundamentais das mulheres

Por ter sido submetida a uma laqueadura de forma compulsória, uma mulher irá receber uma indenização por danos morais no valor de R$ 100 mil, de acordo com uma decisão judicial obtida pela Defensoria Pública de SP.
 
"Esta é uma decisão importante, pois reconhece a responsabilidade do Estado ao determinar e realizar uma esterilização compulsória - o que fere desde normativas internacionais de proteção aos direitos humanos das mulheres, até mesmo a Constituição Federal, a Lei do Planejamento Familiar e os direitos fundamentais das mulheres, que devem ser pautados na autonomia, nas escolhas das próprias mulheres em relação à sua saúde sexual e reprodutiva", avalia a Defensora Pública Paula Sant'Anna Machado de Souza, coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres da Defensoria Pública paulista.
 
O caso aconteceu em 2018. Na ocasião, uma ação proposta pelo Ministério Público pedia a esterilização compulsória da mulher. O pedido foi deferido pelo juízo que analisou o caso e, então, ao dar à luz ao filho que esperava, a mulher foi submetida à laqueadura tubária. Embora a decisão judicial tenha sido reformada posteriormente pelo Tribunal de Justiça, o procedimento irreversível já havia sido realizado.
 
Dessa forma, o Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres da Defensoria Pública de SP ajuizou uma ação de reparação de danos em favor desta mulher, apontando que o ato praticado caracteriza violação aos seus direitos fundamentais. 
 
As Defensoras Públicas Paula Sant'Anna Machado de Souza e Ana Rita Souza Prata, responsáveis pela ação, apontaram que a Constituição Federal garante o livre planejamento familiar, com vedação expressa de qualquer forma coercitiva de controle por parte de instituições oficiais ou privadas. Citaram, ainda, a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra as Mulheres - da qual o Brasil é signatário - e outras normas internacionais que vedam expressamente a esterilização sem consentimento. 
 
Na análise do pedido, o juiz Renato Augusto Pereira Maia destaca a importância do consentimento da mulher para a realização do procedimento de esterilização. "Ignorar a autonomia individual neste particular, mediante práticas forçadas, significaria dar à pessoa humana um tratamento de coisificação, oposto, portanto, ao da dignificação".
 
O Magistrado também aponta a vedação de qualquer forma coercitiva de esterilização. "A esterilização compulsória enseja inadmissível preconceito social contra as pessoas pobres, uma vez que existem alternativas jurídicas disponíveis de assistência social e de orientação de planejamento familiar. (...) A liberdade do próprio corpo é elemento essencial da dignidade humana. Reduzir um ser, dotado de autonomia e autodeterminação, a método de castração compulsório é desprezar anos de lutas por igualdade de gênero". Assim, julgou "imperiosa a condenação do Estado em danos morais", fixando a indenização no valor de R$ 100 mil.
 
Cabe recurso da decisão.