Defensorias Públicas de SP e da União sugerem à ONU recomendações acerca da falta de acessibilidade nas prisões brasileiras

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”

Publicado em 10 de Agosto de 2015 às 08:00 | Atualizado em 10 de Agosto de 2015 às 08:00

A Defensoria Pública de SP e a Defensoria Pública da União enviaram nesta semana ao Comitê dos Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU um ofício em que expõem a falta de condições de acessibilidade e segurança nas prisões brasileiras para acomodar pessoas com deficiência.
 
>>> Confira o ofício na íntegra (em inglês), já disponível no site do Comitê.
 
O documento também sugere intervenção para que o Brasil, Estado parte da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, estabeleça medidas para garantir instalações com acessibilidade nas unidades prisionais.
 
O texto é assinado pelo Defensor Público Federal João Freitas de Castro Chaves e pelos Defensores Públicos do Estado de SP Bruno Shimizu, Patrick Lemos Cacicedo, Verônica dos Santos Sionti, que atuam no Núcleo de Situação Carcerária; Renata Flores Tibyriçá e Felipe Hotz de Macedo Cunha, ambos do Núcleo de Direitos do Idoso e da Pessoa com Deficiência.
 
De acordo com o Defensor Felipe Hotz, o objetivo com o envio do ofício é contribuir para a análise da situação no Brasil, que se comprometeu a submeter relatórios para esclarecer as medidas adotadas em cumprimento às obrigações previstas pela Convenção. A norma internacional hoje tem status de norma constitucional, após ser ratificada via Decreto Legislativo nº 186/2008 pelo país e promulgada pelo Decreto Executivo 6.949/2009.
 
A Defensora Pública Verônica Sionti ressalta que a falta de acessibilidade nas prisões torna mais necessária a efetiva aplicação de dispositivos legais que permitem prisão domiciliar ou indulto humanitário às pessoas com deficiência, mas para isso é preciso conseguir identificá-las, o que hoje é muito pouco comum.
 
Falta de acessibilidade
 
O ofício se baseia em relatos de presos, visitas dos Defensores a unidades prisionais paulistas e no informativo Infopen publicado em junho pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen) sobre o sistema carcerário brasileiro. Os Defensores afirmam que o Brasil possui legislação que determina condições de acessibilidade e normas técnicas para unidades prisionais – norma ABNT NBR 9050:2004 –, mas a realidade é bem diferente.
 
De acordo com o Infopen, apenas 6% das celas nas prisões brasileiras são adaptadas conforme a referida norma; outros 4% são considerados adaptados, mas não totalmente; sobre 8% não há qualquer informação; e em 82% das unidades as instalações foram consideradas sem qualquer acessibilidade. Das pessoas com deficiência presas, 87% estavam custodiadas em locais sem acessibilidade, e apenas 5% em unidades totalmente adaptadas.
 
A situação não é diferente da detectada nas visitas a quase 40 unidades prisionais feitas desde outubro de 2014 pelo Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública de SP: nenhuma delas contemplava normas de acessibilidade. Um exemplo citado é o de um homem paraplégico e tuberculoso que era mantido numa enfermaria, próximo de pessoas com outras doenças contagiosas, e deitado o tempo todo, pois não havia cadeira de rodas disponível. Em outras unidades, presos com deficiência dividiam celas com detentos com doenças.
 
Recomendações
 
O ofício ressalta que a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, no artigo 9, obriga os Estados partes a identificar e eliminar barreiras e obstáculos à acessibilidade, e, no artigo 14, garantam acomodações razoáveis em prisões, objetivos reforçados pelo Comentário Geral nº 2 do Comitê da ONU.
 
Considerando o artigo 9, os Defensores recomendam no documento que o Brasil estabeleça e siga prazos, aloque pessoal e recursos financeiros adequados para remover barreiras à acessibilidade nas prisões, defina os deveres das autoridades e órgãos quanto ao problema e garanta mecanismos de monitoração e sanção efetivos em caso de falha na implementação de padrões de acessibilidade.
 
Em relação ao artigo 14, recomenda que o país introduza medidas efetivas para assegurar acomodações razoáveis nas prisões, para preservar a dignidade das pessoas com deficiência presas. Como medida urgente, o documento pede que o país se abstenha de submeter qualquer pessoa com deficiência a unidades prisionais não acessíveis, sugerindo a aplicação de medidas como prisão domiciliar e manter essas pessoas como beneficiárias do indulto humanitário.