Direito Penal: a pedido da Defensoria, STJ restaura absolvição pelo Júri baseada em quesito obrigatório, decidindo que anulação por contrariedade de provas depende de fundamentação concreta

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”

Publicado em 26 de Março de 2018 às 12:00 | Atualizado em 26 de Março de 2018 às 12:00

A anulação por contrariedade à prova dos autos de um julgamento realizado pelo Tribunal do Júri, no caso em que, apesar de reconhecerem materialidade e autoria do crime, os jurados tiverem respondido “sim” ao quesito genérico pela absolvição do réu, depende da indicação de fundamentação concreta, ainda que a defesa tenha argumentado apenas pela negativa de autoria.
 
Com esse entendimento, a Ministra Maria Thereza de Assis Moura, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), cassou um acórdão da 8ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça paulista (TJSP), acolhendo recurso especial formulado pela Defensora Pública Iuscia Dutra Barboza.
 
O acórdão havia anulado um julgamento do Tribunal do Júri de Itapetininga, no qual os jurados absolveram o réu, após responderem “sim” aos quesitos sobre autoria e materialidade do crime – ou seja, entenderam que o crime aconteceu e foi efetivamente praticado pelo réu. No entanto, também votaram sim à pergunta “O jurado absolve o acusado?”, quesito obrigatório previsto pelo Código de Processo Penal, no inciso III do artigo 483.
 
Em recurso contra a decisão, o Ministério Público alegou que ela contrariou as provas no processo, e o TJSP anulou o julgamento, determinando a realização de novo plenário. A Corte ressaltou que a defesa do réu se limitou a negar que o réu praticou o crime, deixando de apresentar qualquer argumento sobre eventual excludente de ilicitude para a prática do delito, e que a decisão dos jurados contrariou as provas.
 
Recurso Especial
 
Após a decisão do TJSP, a Defensora Pública Iuscia Dutra Barboza interpôs recurso especial ao STJ. Ela argumentou que o acórdão violou a soberania dos veredictos do Tribunal do Júri e o quesito obrigatório que pergunta aos jurados sobre a absolvição, “ignorando a possibilidade de os jurados absolverem por clemência ou qualquer outro motivo”, independentemente das teses de defesa alegadas.
 
“(...) não se pode perquirir as razões de os jurados terem decidido pela absolvição do acusado. O quesito obrigatório (...) inclui todas as teses absolutórias, inclusive as que eventualmente sequer foram arguidas pela defesa. E os jurados não precisam e não devem fundamentar sua decisão, sendo impossível saber qual foi o motivo pelo qual absolveram o réu, sendo também impossível argumentar-se que tal motivo seja manifestamente contrário à prova dos autos”, apontou a Defensora. Ela afirmou que, quando o julgamento for positivo ao réu no quesito sobre a absolvição, nunca será admitido recurso da acusação com base no artigo 593, III, “d” (hipótese de decisão manifestamente contrária à prova dos autos).
 
O recurso especial seguiu orientação da tese institucional número 93 da Defensoria Pública de SP, segundo a qual “Em caso de absolvição no júri com base no terceiro quesito obrigatório (art. 483, III, do Código de Processo Penal) é inadmissível o recurso da acusação com fundamento no art. 593, III, b, do Código de Processo Penal (decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos)”.
 
Julgamento
 
Em julgamento do recurso, a Ministra Maria Thereza de Assis Moura considerou que o acórdão contraria a jurisprudência do STJ, e acolheu a argumentação da Defensoria, proferindo decisão monocrática – conforme orientação da Súmula 568 do STJ para casos em que haja entendimento dominante sobre o tema.
 
A Ministra cita precedentes do STJ segundo os quais é obrigatória a formulação e resposta pelos jurados ao quesito genérico sobre a absolvição do réu, ainda que a única tese da defesa seja a negativa de autoria. Ainda conforme a decisão, o TJSP não utilizou fundamentação concreta para demonstrar que a absolvição contrariou a prova dos autos, em flagrante ofensa à soberania dos veredictos.
 
“(...) tendo o Júri respondido afirmativamente ao quesito obrigatório referente à absolvição, não há falar em julgamento manifestamente contrário à prova dos autos apenas em razão de que foi reconhecida pelos jurados a materialidade e a autoria (única tese defensiva), sendo necessária, para a anulação do julgamento pelo Conselho de Sentença, a indicação de motivação idônea, amparada no conteúdo fático-probatório do presente feito”, afirmou na decisão a Ministra.