Ato Normativo DPG nº 317, de 15 de outubro de 2025  

Institui o Observatório das Comunidades, vinculado à Divisão de Atendimento Inicial Especializado ao Público, com a finalidade de desenvolver o atendimento inicial de demandas coletivas relacionadas a conflitos fundiários, habitação e urbanismo.

CONSIDERANDO que incumbe à Defensoria Pública a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus de jurisdição e de forma extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do art. 134 e art. 5°, LXXIV da Constituição Federal;

CONSIDERANDO que o acesso à justiça não se limita ao acesso ao Poder Judiciário, mas à ordem jurídica justa, que possui como dimensão o direito à solução adequada dos conflitos, nos termos do que dispõe a Resolução do Pleno do CONDEGE nº 1, de 13 de dezembro de 2024.

CONSIDERANDO que são objetivos da Defensoria Pública, dentre outros, a primazia da dignidade da pessoa humana, e a redução das desigualdades sociais e a prevalência e efetividade dos direitos humanos;

CONSIDERANDO que são atribuições institucionais da Defensoria Pública promover a ação civil pública e todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos quando o resultado da demanda puder beneficiar grupo de pessoas hipossuficientes;

CONSIDERANDO que é função institucional da Defensoria Pública, na qualidade de Custos Vulnerabilis, dentre outras, exercer a defesa dos interesses dos indivíduos e dos grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado, nos termos do art. 554, §1°, do Código de Processo Civil;

CONSIDERANDO o compromisso da Defensoria Pública com a promoção da justiça social, a defesa de direitos coletivos e o enfrentamento de conflitos fundiários e urbanos complexos;

CONSIDERANDO o guia elaborado pela Relatoria Especial da ONU sobre Habitação e a inclusão, pela ONU, do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 11 (ODS 11) em sua Agenda 2030, focado na construção de cidades e comunidades mais inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis;

CONSIDERANDO que a cidade de São Paulo tem 11,4 milhões de habitantes e, deste total, 15% vivem em alguma das 1.359 comunidades urbanas identificadas no município, conforme o Censo 2022 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística);

CONSIDERANDO a necessidade institucional de aprimorar o acolhimento de demandas coletivas de comunidades vulnerabilizadas e promover soluções extrajudiciais mais céleres e efetivas,

A DEFENSORA PÚBLICA-GERAL DO ESTADO, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo art. 100, da Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994, e pelo art. 19, I, III e XII da Lei Complementar Estadual nº 988, de 9 de janeiro de 2006, RESOLVE:

CAPÍTULO I – DA INSTITUIÇÃO E DAS COMPETÊNCIAS 

Art. 1º Instituir o Observatório das Comunidades, vinculado à Divisão de Atendimento Inicial Especializado ao Público e subordinado à Segunda Subdefensoria Pública-Geral, com a finalidade de desenvolver o atendimento inicial de demandas coletivas relacionadas a conflitos fundiários, habitação e urbanismo da Capital.

Parágrafo único. O Observatório das Comunidades será composto por:

I – um/a Defensor/a Público/a especialmente designado/a pela Defensoria Pública-Geral para a coordenação do órgão, considerando-se a experiência em atuação coletiva e temas como conflitos fundiários, habitação e urbanismo;

II – equipe de apoio, que será composta por servidores/as e estagiários/as.  

Art. 2º Compete ao Observatório das Comunidades:

I – realizar o acolhimento inicial de demandas coletivas da Capital, especialmente aquelas relacionadas a conflitos fundiários coletivos, habitação e urbanismo;

II – atuar na interlocução com órgãos públicos, movimentos sociais, lideranças comunitárias e outros entes públicos ou privados, buscando o tratamento adequado de conflitos identificados através de soluções consensuais e extrajudiciais;

III – produzir documentos, diagnósticos, relatórios, pareceres ou notas técnicas que sistematizem as informações colhidas e sirvam de base para a atuação judicial pelas Unidades competentes;

IV – promover articulação com os Núcleos Especializados e Unidades da Defensoria Pública, com vistas à uniformização de entendimentos e racionalização da atuação institucional;

V – sistematizar dados e propor medidas de aperfeiçoamento da política institucional de demandas coletivas;

VI – propor, em diálogo com outros órgãos e poderes, alterações em políticas públicas com base na análise recorrente de demandas coletivas e diagnósticos produzidos no atendimento inicial;

VII – desenvolver e executar ações de educação em direitos voltadas às comunidades atendidas, com foco na formação cidadã, fortalecimento da organização popular e redução da litigiosidade.

§1º Ao verificar, no caso concreto, que o tratamento de conflitos através de soluções consensuais e extrajudiciais se mostra inadequada ou insuficiente para a proteção do direito, o Observatório das Comunidades remeterá a demanda à Unidade ou órgão respectivo, na forma do disposto no art. 4º deste Ato.

§2º No atendimento à coletividade que tenha processo judicial em andamento, compete ao Observatório das Comunidades o acolhimento, identificação do problema, orientação jurídica e encaminhamento para a Unidade competente, com o devido agendamento.

Art. 3º Para fins do disposto no art. 2º, I, deste Ato, nos procedimentos administrativos de regularização fundiária coletiva de interesse social, quando constatado, pelo Observatório das Comunidades, risco concreto de violação de direitos, morosidade na tramitação ou exclusão indevida de famílias, o órgão poderá realizar excepcionalmente as providências imediatas necessárias, seguidas de remessa à Unidade competente para, se o caso, a propositura da ação judicial respectiva.

Parágrafo único. A atribuição em regularização fundiária tem caráter de atendimento inicial especializado, não havendo competência do Observatório das Comunidades para a atuação jurídica permanente de processos administrativos.

Art. 4º O Observatório das Comunidades deverá realizar o repasse dos casos às Unidades com atribuição para judicialização, observados os seguintes parâmetros:

I – reunião de transição intersetorial realizada com a Unidade destinatária, com participação de membro do Observatório e, sempre que pertinente, de integrantes dos Núcleos Especializados, para apresentação do caso, das tratativas já realizadas e dos documentos disponíveis;

II – relatório circunstanciado a ser entregue para a Unidade destinatária, contendo histórico dos fatos, diagnóstico da situação jurídica e social, documentos relevantes, contatos estabelecidos e eventuais propostas de encaminhamento;

III – acompanhamento técnico pós-repasse por meio de canal aberto de comunicação do Observatório com a Unidade;

IV – sistema de pactuação em casos de sobrecarga operacional ou de múltiplas unidades envolvidas, quando poderá ser solicitado afastamento de Defensores/as, redistribuição excepcional, prioridade de atendimento da coletividade, mediante decisão da Defensoria Pública-Geral.

Art. 5º Em caráter excepcional, quando constatada situação de urgência capaz de ocasionar o perecimento do direito ou risco de dano irreparável, o Observatório das Comunidades poderá ingressar com imediata medida judicial, promovendo o protocolo da ação diretamente, com o posterior encaminhamento do expediente à unidade com atribuição para acompanhamento.

§ 1º A medida judicial excepcional deverá ser comunicada à Unidade competente no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas, com remessa integral da documentação e das informações pertinentes para subsequente acompanhamento, inclusive quanto a eventuais medidas liminares pleiteadas.

§ 2º A excepcionalidade da medida deverá ser justificada em decisão escrita e fundamentada, consignando a urgência, o risco e as razões que impediram a tramitação regular de encaminhamento prévio à Unidade.

§ 3º A atuação prevista neste artigo não implica alteração da atribuição ordinária dos órgãos de atuação para acompanhamento e prosseguimento do feito judicial, cabendo ao Observatório apenas a prática inicial indispensável à preservação do direito ameaçado.

CAPÍTULO II – DO ATENDIMENTO AO PÚBLICO

Art. 6º O atendimento ao público será realizado de forma agendada, a partir do envio do pedido para o correio eletrônico comunidades@defensoria.sp.def.br, sem prejuízo de outras formas de agendamento a serem disponibilizadas pela Instituição.

Parágrafo único. O/a usuário/a, ao acessar qualquer das ferramentas disponibilizadas, inclusive na modalidade presencial, será agendado/a para atendimento em dia e horário determinados.

Art. 7º Os casos de urgência receberão datas de agendamento diferenciadas dos demais casos no atendimento.

Parágrafo único. Demandas que envolvam perecimento de direitos poderão ter fluxo diverso, independentemente de agendamento.

Art. 8º O atendimento inicial especializado ao público ocorrerá, em regra, na sede do Observatório das Comunidades, em datas agendadas, que poderão ser de segunda a sexta-feira, observada a ordem de chegada e as prioridades legais, ressalvadas determinações específicas da respectiva Subdefensoria Pública-Geral, conforme análise do fluxo de pessoas e outras necessidades de atendimento, ouvida a Assessoria da Qualidade do Atendimento e Inovação.

CAPÍTULO III – DA AVALIAÇÃO DE VULNERABILIDADES E DO CADASTRO DAS COLETIVIDADES

Art. 9º A avaliação da hipossuficiência individual das pessoas cujas informações forem passíveis de coleta será realizada conforme a Deliberação CSDP nº 89/2008.

Parágrafo único. Sem prejuízo do disposto no caput, admite-se, de forma fundamentada, a aferição das vulnerabilidades específicas da coletividade no caso concreto, nos termos do §15 do art. 2º da referida Deliberação.

Art. 10 É obrigatório o registro do atendimento no sistema Defensoria Online – DOL, admitido o cadastramento em nome da coletividade, sem prejuízo da inclusão, no mesmo sistema, dos dados individuais das pessoas cujas informações forem passíveis de coleta.

CAPÍTULO IV – DO MONITORAMENTO DA QUALIDADE DO SERVIÇO

Art. 11 O Observatório das Comunidades deverá sistematizar, analisar e divulgar, semestralmente, relatório das atividades desenvolvidas no período e resultados obtidos.

Art. 12 O Observatório das Comunidades promoverá, anualmente, seminário ou audiência pública destinado à apresentação das atividades realizadas, à avaliação da qualidade dos serviços prestados e à coleta de sugestões para seu aperfeiçoamento.

CAPÍTULO V – DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 13 Ficam acrescidos ao Ato Normativo DPG nº 106, de 28 de maio de 2015, os seguintes dispositivos:

“Art. 4º ...

§5º A delegação aos/às Defensores/as Públicos/as Auxiliares não abrange o julgamento dos recursos de denegação de demandas oriundas do Observatório das Comunidades.

...

Art. 5º-A Delegar ao/à Defensor/a Público/a Coordenador/a do Observatório das Comunidades a análise, no âmbito de sua atribuição, dos fundamentos invocados nos casos de denegação de atendimento, nas hipóteses de não caracterização da hipossuficiência, manifesto descabimento da medida pretendida ou inconveniência aos interesses da parte e quebra na relação de confiança.

Parágrafo único. Incumbe ao/à Segundo/a Subdefensor/a Público/a-Geral do Estado o julgamento de eventual recurso:

I – contra decisão do/a Defensor/a Público/a Coordenador/a do Observatório das Comunidades, na forma do caput deste artigo;

II – contra decisão do/a órgão de atuação em relação a demandas encaminhadas pelo Observatório das Comunidades às unidades, observado o disposto no art. 4º, §5º deste Ato.” (NR)

Art. 14 Este Ato entra em vigor na data de sua publicação.